Quem pensou que o rótulo serviria para desgastar, e para obter dividendos políticos, deve ter se arrependido. O debate está pondo a nu deficiências não apenas no setor de Saúde.
Expõe também o que pensam e como veem o país lideranças de uma corporação, a dos médicos. Mas não só. Os embates públicos permitem quase uma tomografia, um exame clínico do próprio Brasil.
Há argumentos sólidos, ou risíveis, de parte a parte; dos que são a favor e dos que são contra a vinda dos médicos. Dos que são contra, incontáveis relatos sobre o evidente descaso com a infraestrutura da Saúde país afora.
Tais relatos embutem algo precioso a ser discutido. O Brasil tem 513 anos, tem 27 Estados e 5.564 municípios. Por que, até hoje, o país não tem nem um médico em 700 municípios? Por que outro milhar de cidades só tem um ou dois médicos?
A resposta é quase automática e parece fácil: "Porque o governo é incompetente". Como o Brasil tem 513 anos, pergunte-se: qual dos governos? E de qual dos cinco séculos?
Os governos da União? Os de 26 Estados e DF, ou os de mais de 5 mil prefeituras e seus 60 mil vereadores?
Além da União e seu ministério, os Estados e municípios têm Secretarias da Saúde e verbas. Por que não resolvem, ou ao menos amenizam o problema?
Será que o descaso com a Saúde Pública não tem relação com o fato de o país produzir a 2ª pior distribuição de renda do mundo?
Brasileiros ricos têm pelo menos U$ 520 bilhões depositados em paraísos fiscais. Cidadãos devem mais de R$ 1 trilhão ao fisco. E União e Estados devem mais de R$ 100 bilhões aos cidadãos.
Será que isso não caracteriza uma maneira de encarar a vida em sociedade? Em especial, de parte da sociedade que tem e sempre teve poder de fato?
Até que viessem o anúncio do "Mais Médicos" e os tais "médicos cubanos", quando e com que vigor entidades de classe e médicos saíram às ruas para protestar contra o escândalo que é a Saúde Pública?
Quando protestaram, por exemplo, contra planos de saúde que maltratam milhões de pacientes e também os próprios médicos?
Médicos cearenses vaiaram colegas cubanos em Fortaleza. E não nasceu do nada a opinião da jornalista Micheline Borges, que no facebook disse:
-Médicas cubanas têm cara de empregada doméstica. Será que são médicas mesmo? Afe, que terrível. Médico tem postura, cara de médico, se impõe a partir da aparência.
As vaias cearenses não são únicas. E Micheline não é, infelizmente, voz isolada. Elas representam uma porção importante do país. A que resistiu, por exemplo, à PEC das empregadas domésticas. E que pensa exatamente da mesma forma.
Ao supor que defendem a Saúde, pessoas como Micheline ajudam a explicar porque, com 513 anos, o Brasil tem a Saúde Pública que tem.
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