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terça-feira, 20 de dezembro de 2011

A culpa é das finanças?



Não foi apenas o mercado financeiro que entrou em crise, mas sim o capitalismo que está entranhado em nossas vidas

Por Bruno Cava, do Outras Palavras.

Fala-se muito em crise do capitalismo financeiro. A narrativa é mais ou menos assim:

Os culpados principais da crise foram bancos internacionais e grupos de investimento, os grandes players que jogam com a riqueza mundial. Ao longo da última década, extrapolaram todos os limites da cobiça para realizar uma falsa multiplicação dos pães. Mirabolaram produtos financeiros, os derivativos, com o que criaram valor onde não havia nada. Como esse ouro de tolos, incharam bolhas especulativas, descoladas da economia real — fantasiosas e insustentáveis. Sem ser eleitos por ninguém, jogaram muito alto e sem nenhuma garantia com o dinheiro alheio. Aproveitaram-se da desregulamentação do setor e fizeram refém os governos nacionais, incapazes de conter a luxúria por lucros fabulosos — ou talvez cúmplices da brincadeira. Banqueiros, financistas, acionistas e executivos deitaram e rolaram em cima da economia mundial por anos e agora todos pagamos o pato, enquanto os verdadeiros culpados são salvos com o dinheiro público e ainda posam de popstar. Não admira que o movimento Occupy nos Estados Unidos tenha começado por Wall Street.

É o que temos ouvido todos os dias, mas não é bem assim.

Boa parte das críticas se fundamenta numa superficial separação entre finanças e economia real. Como se a dimensão financeira fosse um a-mais ao aspecto real da produção. Como se existissem capitalistas que realmente organizam e comandam a produção de coisas; e os meramente financeiros, que se limitam a atuar na realidade virtual dos mercados e bolsas de valores. Os bons e velhos patrões empreendedoresversus os especuladores yuppies.

Essa interpretação aparece à esquerda e à direita do espectro político-ideológico.

Ambos os lados acusam o capitalismo financeiro de exagerar na dose de capital fictício em proporção ao capital real. Para um e outro, não dá pra continuar apostando na ideologia da mão invisível que vai de Adam Smith a Alan Greenspan — nessa mistificada racionalidade “autônoma” dos mercados e agentes financeiros. Portanto, é preciso aplicar políticas regulativas para controlar o funcionamento do sistema. É preciso punir e criminalizar condutas gananciosas e irresponsáveis. É preciso repensar um novo marco monetário internacional, como o antigo Bretton Woods (1944-72). É preciso resgatar a esfera pública contra o alto clero da econometria.

A direita propugna por uma aliança entre trabalhadores de bem e capitalistas de bem, num novo pacto produtivo, em nome dos valores do trabalho — um novo New Deal. É a posição do Tea Party. A esquerda aproveita para novamente dar vivas ao estado nacional como gestor do capital coletivo, capaz não só de controlar o mercado financeiro como distribuir os seus ganhos. É o discurso do desenvolvimento com inclusão social do governo brasileiro e sua nomenklatura economista. Os dois campos concordam que, assim, se poderão gerar empregos, alimentar a demanda interna e retomar o crescimento.

Há uma limitação séria nessas interpretações, apesar de predominar nas revistas, jornais e sites, especializados ou não. Serão as finanças algo acoplado à economia dita real, que teriam pervertido o capitalismo original, tornando-o mais injusto? É possível salvar o capitalismo de antes da financeirização?

Há uma linha crítica, que vem desde Marx, que acha que não. Me refiro especialmente ao economista Christian Marazzi, de quem resenhei um livro ano passado. Este ano, li mais artigos e outros dois livros dele: A violência do capitalismo financeiro [2010, SemioTexte, em inglês] e O comunismo do capital:financeirização, biopolítica do trabalho e crise global [2010, ombre corte, em italiano]. Descendente da Escola da Regulação Francesa (Michel Aglietta, Robert Boyer, Alain Lipietz etc) e do pós-operaísmo italiano (Antonio Negri), o autor tem o mérito de nunca deixar de reportar as crises à sua dimensão política e social. Quer dizer, não analisa a crise pela ótica de condições objetivas, mas da própria dinâmica de produção de sujeitos sociais, antagonistas ou não.

Para ele, a financeirização é unha e carne com o capitalismo. Não há processo do capital sem crédito — o que Marx desenvolve principalmente no Livro III de O Capital. A crise global é do capitalismo tout court. Pode-se qualificá-la como financeira apenas na medida em que é a presente forma de organização do capitalismo. Mas nunca no sentido dominante, que se poderia salvar algum capitalismo bom do capitalismo financeiro mau. O que faz toda a diferença. Não adianta tentar solucionar a crise do capitalismo financeiro corrigindo o financeiro — quando este é apenas uma consequência daquele. O capitalismo é a crise. Tentar sair da crise melhorando o capitalismo já é repetir a própria lógica de desenvolvimento do sistema, como aconteceu ao longo das crises sistêmicas desde o século 19. Pode-se trabalhar e lutar para outra resposta, afirma Marazzi.

Para ele, as finanças estão imbricadas no processo produtivo como um todo, da produção à circulação, da distribuição ao consumo. De um modo ou de outro, as operações econômicas passam pelos bancos, operadoras de crédito, financiamentos ou investimentos a curto, médio e longo prazos. Tente sobreviver sem uma conta no banco… Cada vez que o sujeito realiza um ato econômico — que produz, circula, troca, consome etc. — já está inscrito nos inúmeros circuitos financeiros. E aí é explorado, pelo fato mesmo de submeter-se a uma métrica de valor, a uma partição de lucros e riscos embutida em juros, taxas e rendimentos. Essa métrica e suas cotações são decididas bem longe dos cidadãos, pelas bolsas de valores, políticas monetárias, agências de classificação de risco e sistema bancário. O cidadão fica à mercê de um mundo cujas leis tudo faz crer alienígenas — tão distante de nosso cotidiano quanto as páginas de economia dos jornais diários. Enquanto isso, a cauda longa da produtividade social vai sendo vampirizada através do valor-finança, dessa lógica de medir e extrair valor, desde os atos mais prosaicos da economia.

Um ponto de Marazzi é que as finanças existem por razões estruturais do sistema. A crise das finanças constitui uma crise histórica, sintética de todas as contradições e limitações que o desenvolvimento do capitalismo acumulou ao longo dos séculos. Demais, a financeirização não é somente da economia, masda vida. Por isso, desdobrando um conceito de Michel Foucault, ele fala em biocapitalismo. O biocapitalismo, que é o capitalismo financeirizado, opera em níveis múltiplos e articulados, grosso modo: 1) como cimentador do capitalismo global, 2) como modo de regulação da economia política, 3) como forma de governança social.

1) Nada parece ser mais central para os governos nacionais do que as políticas monetárias e os bancos centrais, que tentam disciplinar a repartição da riqueza entre devedores e rentistas. A política monetária é a primeira a sofrer a ingerência das instituições internacionais, especialmente nas crises. A globalização não só passa pelas finanças, mas nela se articula política e economicamente. É necessário que estados nacionais e políticas monetárias se integrem ao sistema financeiro. Seu funcionamento globalizado é administrado por uma aristocracia de instituições internacionais, gigantescos bancos de investimento e outros grandes players. Marazzi chama de “comunismo do capital” essa cooperação de capitalistas em organismos e fóruns como Davos, e a sua codificação linguística é sempre financeira. Com ela, permitem mensurar e organizar os fluxos de capital, fabricar consensos políticos e exercer comando sobre os governos nacionais.

2) Como modo de regulação, refere-se ao papel da financeirização para a demanda solvente. Ou seja, dinheiro para gastar + desejo (o núcleo de toda a produção). Sem a demanda solvente, o capitalista não realiza o lucro. É que, para se reproduzir, toda produção precisa concluir o ciclo com um suplemento de valor, que então é reinvestido. É o chamado regime de acumulação e varia em função da época. Hoje, disseminar crédito em toda a sociedade se torna uma estratégia para mover a economia. Em consequência, o acesso à moradia, educação, bens duráveis, pequenos negócios — tudo isso se torna possível graças à facilitação do crédito. Ao longo das últimas décadas, um conjunto de medidas nacionais e internacionais favoreceu o endividamento generalizado das pessoas, mormente na Europa e EUA. Tornou-se normal assumir hipotecas, financiar carros, investir em bolsas universitárias, aplicar na previdência privada etc. O que antes era função do estado de bem estar (emprego e seguridade social), agora se viabiliza com as finanças. Não à toa somos incentivados a usar e abusar do cartão de crédito, que chegam aos cachos pelo correio. Daí a multiplicação de recursos creditícios à população. Que é acompanhada pela mirabolação dos produtos financeiros “derivados” (refinanciamentos, colateralização de riscos, créditos swaps, mercado futuro etc), superdimensionando a base monetária.

3) Mas não é só isso. No capitalismo contemporâneo, a financeirização da vidaatua também como modo de governar as populações. Nos tempos em que se estruturava no welfare, acontecia enquadrando as pessoas na tríade emprego, nação e família. Hoje, noutro modelo, a pessoa fica condicionada pelas finanças. Tem de planejar-se a longo prazo: como vai investir em moradia, em previdência (fundos de pensão), em educação, enfim, em como estruturar a sua vida mediante as estratégias de investimento, retorno e juros, em total dependência do sistema financeiro. A própria família se torna um investimento estratégico, visto que o estado não garante mais nada. A governança opera flexível e difusa, a sociedade precisa aprender a gerir os riscos e oportunidades. Não precisa mais disciplinar o sujeito estritamente nos moldes do trabalhador empregado (pleno emprego), cidadão de bem (nação) e homem/mulher de família. Reestruturam-se formas mais versáteis: empregabilidade (workfare), cidadão cosmopolita (globalização) e relacionamentos líquidos. Por isso, na financeirização, está em jogo também a produção de certa subjetividade do homem moderno — numa dimensão antropológica que às vezes passa despercebida, mesmo em tempos de crise.

No cômputo de seus fatores, a financeirização da vida tem possibilitado não apenas uma transferência brutal da massa endividada (99%) aos rentistas (1%), mas também tem fabricado governamentalidade das populações em escala global.

Mais do que se pautar pelas estratégias florentinas e teorias conspiratórias dos tubarões, como num filme de Oliver Stone, o sistema capitalista global está entranhado no cotidiano e nas formas de vida contemporâneas. É como se fosse uma argamassa social e todos estamos incluídos em sua dinâmica. O mundo das finanças é a culminância de uma abstração que atinge proporções planetárias, e à qual ainda rendemos a nossa servidão voluntária. Nessa perspectiva biocapitalista, o sistema precisa investir a vida de todos, incluir a todos nas dinâmicas de crédito e capitalização das esperanças (investimentos) e medos (securitização) — mas ao mesmo tempo nos inclui como excluídos do rentismo. Eis aí a contradição esgarçada pela crise: entre as forças produtivas (multidão de endividados) e as relações de produção (a financeirização, que concentra a riqueza).

Esse processo não pode ser separado do capitalismo — ele é o seu próprio modo de funcionamento, radicalizado a partir das crises anteriores, nos anos 1970-80. Não há mais economia real a que pudéssemos regressar. Porque o mundo não é mais como era em 1950 ou 1960, quando em alguns países do hemisfério norte havia welfare state. Alguns economistas do campo da esquerda tupiniquim até hoje sonham com o pleno emprego e a seguridade social da Suécia de 1970, numa nostalgia do que não vivemos. Porém, não só a economia não é a mesma: as relações políticas, os sujeitos sociais e o próprio desejosofreram mutações irreversíveis.

Isso tudo entrou em crise. Qual seria o caminho além de uma tentativa de sanear o capitalismo ou tentar voltar ao estado social europeu do pós-guerra? Como entrar na crise, assumi-la em seu sentido pleno como crise política e social, e acima de tudo radicalizá-la para tentar superar as limitações e contradições mais recônditas e simultaneamente óbvias do sistema? Eis aí desafios enormes, à altura do desejo criativo de uma geração que se revolta pelo mundo todo. É assunto apaixonante que, com as leituras de Marazzi e outros pensadores originais, pretendo abordar em próximos artigos.




A sombra das 'democraduras'





Que virá quando os europeus constatarem que seus sacrifícios são vãos? Uma resposta conjunta dos poderes econômico, midiático e militar?

Por Ignacio Ramonet* | Tradução: Antonio Martins

Agora está claro: não existe, no interior da União Europeia, nenhuma vontade política de enfrentar os mercados e resolver a crise. Até há pouco, atribuiu-se a lamentável atuação dos dirigentes europeus à sua desmedida incompetência. Mas esta explicação, ainda que correta, não basta, sobretudo depois dos recentes “golpes de Estado financeiros” que puseram fim, na Grécia e na Itália, a certa concepção de democracia. É óbvio que não se trata só de mediocridade e incompetência, mas de cumplicidade ativa com os mercados.

A que chamamos “mercados”? A este conjunto de bancos de investimento, companhias de seguro, fundos de pensão e fundos especulativos (hedge funds) que compram e vendem essencialmente quatro tipos de ativos: moedas, ações, papéis da dívida dos Estados e produtos derivados dos três primeiros.

Para ter ideia se sua força colossal, basta comparar duas cifras: a cada ano, as empresas de bens e serviços criam, em todo o mundo, uma riqueza estimada (se medida pelo PIB) em cerca de 45 trilhões de euros. Ao mesmo tempo, em escala planetária, os “mercados” movem capitais avaliados em 3.450 trilhões de euros. Ou seja, setenta e cinco vezes o que produz a economia.

Consequência: nenhuma economia nacional, por poderosa que seja (a da Itália é a oitava do mundo), pode resistir aos assaltos dos mercados quando estes decidem atacá-la de forma coordenada, como estão fazendo há mais de um ano contra os países europeus depreciativamente qualificados como PIGS [porcos, em inglês]: (Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha).

O pior é que, ao contrário do que se poderia pensar, estes “mercados” não são unicamente forças exóticas, vindas de algum horizonte distante para agredir nossas gentis economias locais. Não. Em sua maioria, os “atacantes” são nossos próprios bancos europeus (estes mesmos que foram salvos, com nosso dinheiro, pelos Estados, na crise de 2008). Para dizer de outra maneira, não são apenas fundos norte-americanos, chineses, japoneses ou árabes os que estão atacando maciçamente alguns países da zona do euro.

Trata-se essencialmente de uma agressão de dentro, dirigida pelos próprios bancos europeus, as companhias europeias de seguros, os fundos especulativos europeus, os fundos europeus de pensão, as instituições financeiras europeias que administram as poupanças dos europeus. São eles que possuem a parte principal da dívida dos Estados.1 E que, para defender em teoria os interesses de seus clientes, especulam e obrigam os Estados a elevar as taxas de juros que pagam, a ponto de levar vários (Irlanda, Portugal, Grécia) à beira da quebra. Com o consequente castigo para os cidadãos, que devem suportar medidas “de austeridade” e brutais ajustes decididos pelos governos europeus para “acalmar” os mercados-abutres – ou seja, seus próprios bancos.

Estas instituições, além de tudo, conseguem facilmente dinheiro do Banco Central Europeu a 1,25% de juros, e o emprestam a países como Espanha ou Itália a… 6,5%. Daí a importância escandalosa das três grandes agências de avaliação de riscos (Fitch Ratings, Moody’s e Standard & Poor’s): da nota que atribuem a um país2 depende o nível dos juros que este pagará para obter um crédito dos mercados. Quanto mais baixa a nota, mais altos os juros.

Estas agências não apenas costumam equivocar-se – em particular em sua opinião sobre as hipotecas subprime [de segunda linha] norte-americanas, que deram origem à crise atual – mas desempenham, num contexto como o de hoje, um papel perverso e execrável. Como é óbvio que todos os planos “de austeridade” de cortes de direitos e ataque aos serviços públicos irão se traduzir em queda do índice de crescimento, as agências baseiam-se nisso para rebaixar a nota do país. Consequência: este deverá reservar mais dinheiro para o pagamento de sua dívida. Dinheiro que precisará obter cortando ainda mais o orçamento. Provocando queda inevitável da atividade econômica e das próprias perspectivas de crescimento. E então, de novo, as agências rebaixarão sua nota.

Este ciclo infernal de “economia de guerra” explica porque a situação da Grécia foi se degradando tão drasticamente, à medida que seu governo multiplicava os cortes e impunha uma férrea “austeridade”. De nada serviu o sacrifício dos cidadãos. A dívida da Grécia baixou ao nível dos “títulos podres”.

Deste modo, os mercados obtiveram o que queriam: que seus próprios representantes cheguem ao poder, sem precisar submeter-se a eleições. Tanto Lucas Papademos, primeiro-ministro da Grécia, quanto Mario Monti, presidente do Conselho de Ministros da Itália, são banqueiros. Os dois, de uma maneira ou de outra, trabalharam para o banco norte-americano Goldman Sachs, especializado em colocar seus homens nos postos de poder.3 Ambos são, também, membros daComissão Trilateral.

Estes tecnocratas planejam impor — custe o que custar socialmente e nos marcos de uma “democracia limitada” — as medidas que os mercados exigem (mais privatizações, mais cortes, mais sacrifícios) e que alguns dirigentes políticos não se atreveram a tomar, por temerem a impopularidade que tudo isso provoca.

A União Europeia é o último território no mundo em que a brutalidade do capitalismo é mitigada por políticas de proteção social. Isso que chamamos “estado de bem-estar”, os mercados já não toleram e querem demolir. Esta é a missão estratégica dos tecnocratas que chegam ao centro do governo graças a uma nova forma de tomada de poder: o golpe de Estado financeiro. Apresentado, é claro, como compatível com a democracia…

É pouco provável que os tecnocratas desta “era pós-política” consigam resolver a crise. Se sua solução fosse técnica, já teria sido adotada. Que se passará quando os cidadãos europeus constatarem que seus sacrifícios são vãos e que a recessão se prolonga? Que níveis de violência os protestos alcançarão? Como se manterá a ordem na economia, nas mentes e nas ruas? Haverá uma tripla aliança entre o poder econômico, o midiático e o militar? As democracias europeias se converterão em “democraduras”?


(*) Ignacio Ramonet é jornalista, presidente da Associação Memória das Lutas e editor do Le Monde Diplomatique, edição espanhola
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Notas

1 Na Espanha, por exemplo, 45% da dívida pública é controlada pelos próprios bancos espanhóis. Dos 55% restantes, dois terços são detidos por instituições financeiras do resto da União Europeia. Significa que 77% da dívida espanhola foi adquirida por europeus e que apenas os 23% restantes encontram-se em mãos de instituições estrangeiras à UE
2 A nota mais alta é AAA, que no final de novembro só possuíam no mundo poucos países: Alemanha, Austrália, Áustria, Canadá, Dinamarca, França, Finlândia, Holanda, Reino Unido, Suécia e Suíça. A nota dos Estados Unidos foi rebaixada, em agosto, para AA+. A da Espanha é atualmente AA, idêntica às do Japão e China.
3 Nos Estados Unidos, o Goldman Sachs já conseguiu, por exemplo, fazer de Robert Rubin secretário do Tesouro do presidente Clinton; e de Henry Paulson, o ocupante do mesmo posto no gabinete de George W. Bush. O novo presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, foi também vice-presidente do Goldman Sachs para a Europa, entre 2002 e 2005.


segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Oposição social na era da Internet




Os “activistas de teclado” não arriscam nada e pouco realizam. O intelectual público faz a ligação entre o descontentamento dos indivíduos e o activismo social da colectividade

Por James Petras, Global Research

A relação entre as tecnologias da informação, e mais precisamente a internet, com a política é uma questão central para os movimentos sociais contemporâneos. Tal como outros avanços tecnológicos no passado, as tecnologias da informação (TI) servem um duplo propósito: por um lado contribuem para acelerar os movimentos de capitais (sobretudo de capitais financeiros), facilitando uma globalização imperialista. Por outro, a internet fornece importantes fontes alternativas de análise, assim como uma forma fácil de comunicação, que pode servir para a mobilização dos movimentos populares.

A indústria das tecnologias da informação criou uma nova classe de multimilionários, que se estende de Silicon Valey na California até Bangalore na India. Estes desempenham um papel central na expansão do colonialismo económico através do controlo monopolista que exercem sobre as mais diversas esferas de difusão da informação e do entretenimento.



Parafraseando Marx: “a internet tornou-se o ópio do povo”. Novos e velhos, empregados e desempregados, todos eles passam horas passivamente contemplando espectáculos, pornografia, video-jogos, consumindo online e até acedendo a “notícias”, isolados dos restantes cidadãos e trabalhadores.

Em muitas ocasiões, a superabundância de “notícias” na internet, absorve tempo e energia, desviando os “observadores” da reflexão e da acção propriamente dita. Assim como a escassa e tendenciosa informação dos meios de comunicação de massas distorce a consciência popular, o excesso de mensagens na internet pode imobilizar a acção dos cidadãos.

A internet, propositadamente ou não, “privatizou\particularizou” a vida política. Muitos activistas potenciais foram levados a acreditar que o envio de manifestos a outros cidadãos é um acto político, esquecendo-se que apenas a acção pública, incluíndo a confrontação com os seus adversários no espaço público, nos centros das cidades assim como no campo, é a base da transformação política.

As tecnologias da informação e o capital financeiro

Recordemos que o ímpeto original que presidiu ao crescimento das tecnologias da informação partiu das necessidades das grandes instituições financeiras, bancos de investimento e dos especuladores, que pretendiam mover milhares de milhões de dolares, de um país para o outro, de uma empresa para outra, de uma mercadoria para outra, com um simples toque de dedos.

A Internet foi a tecnologia motora do crescimento da globalização ao serviço do capital. As tecnologias da Informação desempenharam um papel central na precipitação das duas crises financeiras da última década (2001-2002; 2008-2009). A bolha das acções de empresas ligadas às tecnologias da informação em 2001 foi o resultado da promoção e da sobrevalorização das empresas de software, desligadas da economia real. O crash financeiro global de 2008-2009, que se extende até hoje, foi consequência de pacotes computadorizados de activos fraudulentos e de empréstimos imobiliários sub-financiados. As “virtudes” da internet, a velocidade com que transmite informação, revelaram-se, no contexto da expeculação capitalista, um factor determinante da pior crise do capitalismo desde a Grande Depressão dos anos 30.

A democratização da Internet

A internet tornou-se acessível às massas enquanto mercado aberto à exploração comercial, alargando-se posteriormente a usos sociais e políticos, e, mais importante ainda: tornou-se um meio fundamental para informar o grande público da exploração e pilhagem que os bancos multinacionais impunham aos mais variados paìses e aos seus habitantes. A internet ajudou também a expôr as mentiras que subjazem às guerras imperialistas dos Estados Unidos e da União Europeia no Médio-Oriente e no Sul da Ásia.

A internet tranformou-se assim num terreno contestado, numa nova forma de luta de classes, que engloba movimentos pró-democracia e de libertação nacional. Os maiores movimentos e os seus líderes, desde os guerrilheiros no Afeganistão aos activistas pró-democracia no Egipto, passando pelo movimento estudantíl chileno e pelo movimento pela habitação popular na Turquia, todos eles contam com a internet para informar o mundo das suas lutas, dos seus programas, da repressão estatal de que são alvos, bem como das suas vitórias. A internet liga as diferentes lutas muito para lá das fronteiras nacionais – é uma ferramenta central para a construção de um novo internacionalismo que faça face à globalização capitalista e às suas guerras imperialistas.

Parafraseando Lénine poderiamos dizer que o socialismo do século XXI pode resumir-se na formula: “os sovietes mais a internet = socialismo participativo”

A internet e a política de classe

É bom recordar que as tecnologias computorizadas de informação não são “neutrais” – o seu impacto político depende dos utilizadores e activistas que determinam quem, e que interesses de classe, é que servem.

A internet serviu para mobilizar milhares de trabalhadores na China contra os exploradores corporativistas, na Índia mobilizou milhares de camponeses contra os especuladores latinfundiários. Por outro lado, a Nato utilizou sistemas de guerra fortemente computorizados para bombardear e destruír a Líbia independente. Os Estados-Unidos também utilizaram “drones” para enviar mísseis para matar cívis no Paquistão e no Yémen; ora esta técnica é controlada por uma inteligência computorizada. A localização da guerrilha colombiana e os bombardeamentos aéreos utilizam a mesma tecnologia computorizada. Em suma, as técnologias da informação podem ter um duplo uso: podem ser utilizadas para a libertação dos povos, mas também podem servir os ataques imperialistas contra-revolucionários.

O neoliberalismo e o espaço público

A discussão acerca do “espaço público” assume frequentemente que “público” é sinónimo de uma maior intervenção estatal em prol do bem-estar da maioria: de uma maior regulação do capitalismo e de uma crescente protecção do meio-ambiente. Por outras palavras aos actores “públicos” benignos opor-se-iam às forças privadas exploradoras dos mercados.

Num contexto de proliferação da ideologia e das políticas neoliberais, muitos autores progressistas escrevem sobre “o declínio da esfera pública”. Esta perspectiva negligencia o facto de a “esfera pública” ter vindo a ganhar uma importância crescente na sociedade, na política e na economia, beneficiando sempre o grande capital, mais concretamente o capital financeiro e os investidores estrangeiros. A “esfera pública”, nesta caso o estado, é muito mais intrusiva na sociedade civil como força repressiva num momento em que as políticas neoliberais aumentam as desigualdades. Graças à intensificação e ao aprofundamento das crises financeiras, a esfera pública (o estado) assumiu um papel fundamental no resgate dos bancos falidos.

Devido aos enormes défices fiscais provocados pela fuga aos impostos do capital, às despesas com as guerras coloniais e aos subsídios públicos às grandes empresas, a esfera pública (o estado) impõe uma austeridade de classe, cortanto as despesas sociais e prejudicando os funcionários públicos, os reformados e os trabalhadores assalariados do privado.

A esfera pública reduziu o seu papel no sector produtivo da economia. No entanto, o sector militar cresceu com a expansão das guerras coloniais e imperialistas.

A questão fundamental que subjaz a qualquer discussão acerca da esfera pública e da oposição social não é a do seu crescimento ou declínio, mas antes a dos interesses de classe que definem o papel dessa esfera pública. No contexto do neoliberalismo, a esfera pública está orientada para a utilização do tesouro público no resgate dos bancos, para o militarismo e para uma larga intervenção policial estatal. Uma esfera pública dirigida pela “oposição social” (trabalhadores, agricultures, profissionais, empregados) alargaria o campo de acção da esfera publica no que toca à saúde, à educação, às pensões, ao ambiente e ao emprego.

O conceito de “esfera pública” tem duas faces (como Jano): uma olha para o capital e para o sector militar; a outra para a oposição laboral/social. A internet está também subordinada a esta dualidade: por um lado, facilita grandes movimentos do capital e rápidas intervenções militares imperialistas; por outro, fornece à oposição social um fluxo de informação rápido que permite a sua mobilização. A questão fundamental é a de saber que tipo de informação é transmitida, a que actores políticos ela é transmitida e que interesse social serve?

A Internet e a oposição social: a ameaça da repressão estatal

Para a oposição social, a internet é antes de mais uma fonte vital de informação alternativa crítica, capaz de educar e mobilizar os dirigentes progressistas, os profissionais, os sindicalistas e os líderes camponeses, os militantes e os activistas. A internet é uma alternativa aos meios de comunicação capitalistas e à sua propaganda, uma fonte de notícias e informações que transmite manifestos e informa os activistas acerca dos locais das intervenções públicas. Graças a este papel progressista como instrumento da oposição social, a internet está sujeita a uma forte vigilância por parte do aparelho repressivo policial e estatal. Nos Estados Unidos, por exemplo, mais de 800 mil funcionários são utilizados pela policia de “Segurança Interna” para espiar milhares de milhões de emails, faxes e chamadas telefónicas de milhões de cidadãos americanos. Saber quão efectivo é o policiamento diário de toneladas de informação é uma outra questão. Mas o facto é que a internet não é uma “fonte livre e segura de informação, debate e discussão”. Com efeito, quanto mais eficaz se torna a internet na mobilização de movimentos sociais que se opõem ao estado imperialista e colonial, mais provável se torna uma intervenção por parte da polícia e do estado com o pretexo de “combater o terrorismo”.

A internet e a luta contemporânea: uma relação revolucionária?

É tão importante reconhecer a importância da internet enquanto detonador de determinados movimentos sociais como relativizar a sua importância global.

A internet teve um papel fundamental na divulgação e mobilização de “movimentos espontâneos”, como o dos “indignados” espanhóis, na sua maioria jovens desempregados e sem filiação partidária, ou na americana “Ocupação de Wall Street”. Noutros casos, como o das massivas greves gerais em Itália, Portugal, na Grécia e em tantos outros sítios, as confederação sindicais organizadas tiveram um papel central e a internet um impacto apenas secundário.

Em países altamente repressivos, como o Egipto, a Tunísia e a China, a internet tem um papel fundamental na divulgação de intervenções públicas e na organização de protestos de massas. No entanto, a internet não levou a qualquer revolução bem sucedida – ela pode informar, ser um local de debate, e mesmo mobilizar, mas não pode oferecer a liderança e a organização necessárias a uma acção política consistente e muito menos fornecer uma estratégia de tomada do poder estatal. Comprova-se assim que a ilusão, alimentada por alguns gurus da internet, de que a acção “computadorizada” pode substituir um partido político disciplinado, é falsa: a internet pode facilitar o movimento, mas apenas uma oposição social organizada lhe pode dar uma direcção tática e estratégica capaz de o manter vivo face à repressão do estado e de o levar a lutas bem sucedidas.

Ou seja, a internet não é um “fim em si mesmo” – a postura autocongratulatória dos ideologos da internet, anunciando uma nova época de informação “revolucionária”, ignora o facto de que NATO, Israel e os seus aliados e clientes utilizam a internet para lançar vírus e destruir economias, para programas de defesa anti-sabotagem e para promover levantamentos etnico-religiosos. Israel enviou vírus danosos para travar o programa nuclear pacífico do Irão; os Estados Unidos, a França e a Turquia instigam, na Líbia e na Síria, uma oposição social capaz de servir os seus interesses. Em resumo, a internet tornou-se um novo terreno de luta de classes e de luta anti-imperialista. A internet é um meio e não um fim. A internet é parte dessa esfera pública, cujos objectivos e resultados são determinados pela estrutura de classe em que se integra.

Comentários finais: “militantes de teclado” e intelectuais públicos

A oposição social é definida pela intervenção pública: pela presença das colectividades nos comícios políticos, pelos indivíduos que discursam em encontros públicos, por activistas que se manifestam em praças públicas, sindicalistas militantes que defrontam os patrões, pessoas pobres que exigem aos governantes locais para morar e serviços públicos…

Discursar activamente num comício público, formular ideias e programas, propor estratégias através da acção política, constitui o papel de um intelectual público. Sentar-se a uma secretária num escritório para, num esplêndido isolamento, enviar cinco manifestos por minuto define um “militante de teclado”. Esta é uma forma de pseudo-militância que separa as palavras dos actos. A “militância” de teclado é um acto de inacção verbal, de “activismo” inconsequente, uma revolução mental de faz-de-conta. A comunicação via internet torna-se um acto político quando se enquadra em movimentos sociais que desafiam o poder. Necessariamente, isto envolve riscos para um intelectual público: desde ataques policiais no espaço público até represálias económicas na esfera privada.

Os “activistas de teclado” não arriscam nada e pouco realizam. O intelectual público faz a ligação entre o descontentamento dos indivíduos e o activismo social da colectividade. O professor universitário vem ao local de acção, fala e regressa ao seu gabinete. O intelectual público fala e faz um compromisso pedagógico de longo termo com a oposição social na esfera pública, tanto através da internet como de frequentes encontros diários cara a cara.


Europa em crise (VI): gráficos de uma hipocrisia

Publicado em 11 de dezembro de 2011 por Antonio Martins




Dados oficiais demonstram: Estados estão endividados porque emprestaram aos bancos; “austeridade” e ataque a direitos jamais atingirão raiz do problema

O argumento central dos governos e da mídia conservadora para defender o corte dos serviços públicos e dos direitos sociais é a promoção da “austeridade”. A palavra foi incorporada ao discurso oficial. Apoia-se num preconceito cultivado durante décadas: o de que despesas públicas são sinônimo de ineficiência e corrupção. Esconde dois fatos essenciais: a) na União Europeia (UE), uma parcela cada vez maior dos gastos dos Estados é empregada para pagar juros; b) enquanto cobram “austeridade” dos aposentados e usuários de serviços públicos há anos em declínio, estes Estados estão sustentando salários milionários, jatinhos, iates e porsches da oligarquia financeira.

Os gráficos deste post ajudam a compreender o fenômeno. Foram produzidos pela revista Economist, que, embora defenda os mercados financeiros, produz excelente jornalismo — e parece perceber, aos poucos, o caráter anti-civilizatório das políticas praticadas na Europa. O primeiro mostra a evolução do déficit público europeu em onze países-chaves, e na média da UE, antes e depois da crise de 2008.

Repare nas três barras azuis, relativas a cada país. Elas referem-se ao resultado final dos orçamentos, consideradas todas as despesas — inclusive o pagamento de juros. Observe que, até 2007 (azul grafite) apenas a Grécia, registrava défict (7% do PIB) acima do autorizado pelos Tratado de Maastrich (3% do PIB, marcados pela linha pontilhada vermelha), que define as políticas monetárias da UE. Todos os demais países respeitavam os limites. Quatro dos onze – Alemanha, Finlândia, Holanda e… Espanha! — chegavam a obter superávits. Na média, restava um déficit inferior a 1% do PIB Se quiser comparar, leve em conta este dado: no Brasil, o déficit é de 2,42% do PIB. Aqui, porém, as taxas de juros são muito mais altas. Se excluído o pagamento de juros, há umsuperávit anual em torno de 3% do PIB.

Veja o que acontece após a crise financeira, na qual os Estados transferiram trilhões de euros aos bancos e demais instituições financeiras. Subitamente, o que eram déficits moderados ou mesmo superávits transforma-se em déficits profundos. Não houve, nesse período, nenhuma nova política de ampliação de direitos sociais ou garantia de qualidade dos serviços públicos: ao contrário. Mas, em 2008 (azul turquesa), todos os doze países registram déficits; nove estão acima do limite de Maastrich. Já em 2011 (azul escuro),todos os países terão déficits além da linha de 3%. A única exceção é a Finlândia (salva por pouco, mas também deficitária…).

Agora pergunte-se: qual a dimensão dos esforços suplementares que exigidos de países como a Grécia (déficit de 15,5%), Irlanda (14%), Espanha (11%), Portugal (10%) e mesmo França (7,5%) ou a média da área do euro (6,5%) se, de fato, for imposta a regra de baixar este índice para 3%? E como será possível justificar politicamente este sacrifício, sabendo que as causas são outras e que a pequena minoria responsável pela crise continua vivendo luxuosamente? Esta é uma das perguntas um artigo em que Ignacio Ramonet refere-se ao risco de “democraduras“.

O segundo gráfico examina o endividamento dos Estados do G-7 (EUA, Japão, Alemanha, França, Reino Unido, Itália e Canadá), a partir de uma perspectiva de mais longo prazo: desde o fim da II Guerra Mundial. Ele evidencia um fenômeno oposto à cantilena dos que exigem “ajustes fiscais” baseados em cortes de gastos do Estado.



A dívida dos Estados não oscila de acordo com os gastos públicos, mas em função de um conjunto muito mais amplo de fatores e decisões políticas. Atente que, na primeira fase retratada pelo gráfico (1950-1975), o endividamento cai de forma abrupta: de 120% do PIB para pouco mais de 30%. É, paradoxalmente, a era dos direitos sociais; da difusão, por toda a Europa, América do Norte e Japão, do welfare state. Os Estados gastaram muito mais e melhor. Mesmo assim, reduziram seus débitos, graças, por exemplo, a taxas de juros muito baixas ou a sistemas de tributação incidiam sobre os muito prósperos, e redistribuíam riqueza.

A curva inverte-se a partir de meados da década 1970. É precisamente o momento em que começam a ser adotadas as políticas neoliberais. O Estado paulatinamente reduzirá seus gastos, porém… isentará de impostos os ricos e as grandes empresas, e elevará as taxas de juros.

A seção final da linha mostra uma radicalização deste processo, a partir da crise de 2008. A curva empina: em cinco anos, o endividamento salta de 80% para 120% do PIB. As causas são o apoio trilionário oferecido aos bancos, no auge da crise de 2008-09, e, a seguir, a elevação das taxas de juros.

Ao cobrarem sacrifícios das sociedades agora, governos, mídia e poder econômico não querem eliminar a dívida. Pretendem, ao contrário, assegurar que ela continue rendendo juros, cada vez mais altos. Para enfrentar o endividamento, há, como a História e os gráficos mostram, outras soluções. No pós-II Guerra, elas foram adotadas porque as classes dominantes do Ocidente temiam o socialismo, e fizeram concessões. No início do século 21, só uma intensa mobilização social — e invenções políticas capazes de gerar lógicas e relações pós-capitalistas – permitirão enfrentar a ditadura das finanças. Até lá, padeceremos.



domingo, 18 de dezembro de 2011

Uma retirada sem glória nem honra


 
Do Blog do Mauro Santayana

 Mais uma vez, os Estados Unidos concluem uma guerra sem ganhá-la, ao não conseguir impor sua plena vontade aos agredidos. Os soldados norte-americanos não saem do Iraque como saíram de Saigon, em 30 de abril de 1975, escorraçados pelas tropas de Hanói e pelos vietcongs. Desta vez, eles primeiro arrasaram o Iraque, durante uma década de bombardeios constantes.

O despotismo de Saddam não incomodava antes os Estados Unidos, quando coincidia com o interesse de Washington. Tanto era assim, que os norte-americanos estimularam a guerra contra o Irã, e lhe ofereceram suporte bélico e diplomático, mas seu objetivo era o de debilitar os dois países. No momento em que — cometendo erro político elementar — Saddam pretendeu restaurar as fronteiras históricas do Iraque, ao invadir o Kueit, Washington encontrou, com o primeiro Bush, o pretexto para a agressão aérea a Bagdad, a criação da chamada zona de exclusão, em que o bombardeio aéreo era indiscriminado, e o bloqueio econômico.

Foram dezenas de milhares de mortos durante os dez anos de ataques aéreos, prévios à invasão. Entre os sobreviventes da agressão, houve milhares de crianças, acometidas de leucemia pela radiação das munições amalgamadas com urânio empobrecido.

Assim, ao invadir o país por terra, os americanos encontraram um exército debilitado, parte do território arrasado e um governo na defensiva diplomática. O pretexto, que os fatos desmoralizaram, era o de que Saddam Hussein dispunha de armas de destruição em massa.

Ontem, o presidente Obama disse que o Iraque é hoje um “país independente, livre e soberano, muito melhor do que era com Saddam”. Saddam, sabem os observadores internacionais, era muito menos obscurantista do que os príncipes da Arábia Saudita.

Seu povo vivia relativamente bem, suas mulheres não eram tratadas com desrespeito e frequentavam a universidade. Algumas ocupavam cargos importantes no governo, na vida acadêmica e nos laboratórios de pesquisas. Havia tolerância religiosa, não obstante a divergência secular entre os sunitas e os xiitas, que ele conseguia administrar, a fim de assegurar a paz interna.

O vice-primeiro-ministro Tarik Aziz era católico, do rito caldeu. País de cultura islâmica, sim, mas talvez o mais aberto de todos eles a outras culturas e costumes. O país se encontrava em pleno desenvolvimento econômico, com grandes obras de infraestrutura, e mantinha excelentes relações com o Brasil, mediante a troca de petróleo por tecnologia e serviços de engenharia, quando começaram os bombardeios.

Depois disso, nos últimos nove anos, a ocupação norte-americana causou a morte de mais de 100 mil civis, 20 milsoldados iraquianos e 4.800 militares invasores, dos quais 4.500 ianques. Milhares e milhares de cidadãos iraquianos ficaram feridos, bem como soldados invasores, a maioria deles mutilados. As cidades foram arrasadas — mas se dividiram os poços de petróleo entre as empresas dos países que participaram da coligação militar invasora.

Hoje não há quem desconheça as verdadeiras razões da guerra, tanto contra o Iraque, quanto contra o Afeganistão: a necessidade do suprimento de petróleo e gás, do Oriente Médio e do Vale do Cáspio, aos Estados Unidos e à Europa Ocidental. Daí a guerra preemptiva e sem limites, declarada pelo segundo Bush, que se dizia chamado por Deus a fim de ir ao Iraque matar Saddam Hussein. Não só os mortos ficam da agressão ao Iraque. Os americanos saem do país, deixando-o sem energia elétrica suficiente, sem água potável, com 15% de desempregados e, 85% dos que trabalham estão a serviço do governo.

Toda a história dos Estados Unidos — ao lado de méritos fantásticos de seu povo — foi construída no afã da conquista e da morte. Desde a ocupação da Nova Inglaterra, não só os índios conheceram a sua fúria expansionista: na guerra contra o México, o país vencido perdeu a metade do território pátrio, o que corresponde a quase um terço do atual espaço norte-americano no continente.

Uma das desgraças da vitória americana foi a ruptura do Compromisso do Missouri, com a ampliação do escravagismo aos novos territórios, que seria — pouco mais de dez anos depois — uma das causas do grande confronto interno, entre o Sul e o Norte, a Guerra da Secessão. Lincoln, que a enfrentou, havia sido, em 1847, um dos poucos a se opor ao conflito contra o México.

A partir de então, a ânsia imperialista dos Estados Unidos não teve limites. Suas elites dirigentes e seus governantes, salvo alguns poucos homens lúcidos, moveram-se convencidos de que cabia a Washington dominar o mundo. Ainda se movem nessa fanática determinação. Agora, saem do Iraque e anunciam que deixarão também o Afeganistão, no ano que vem. Mas, ao mesmo tempo, dentro da doutrina Bush da guerra sem fim, preparam-se para nova agressão genocida contra o Irã.

Os Estados Unidos nunca conheceram a presença de invasores estrangeiros. Sua guerra da independência se fez contra tropas britânicas, que não eram invasoras, mas sim ocupantes da metrópole na colônia. As poucas incursões mexicanas na fronteira, de tão frágeis, não contam. Mas há uma força que cresce, e que não poderão derrotar: a do próprio povo norte-americano, cansado de suportar o imperialismo interno de seus banqueiros e das poucas famílias bilionárias que se nutrem da desigualdade.

O povo, mais do que tudo, se sente exaurido do tributo de sangue que, a cada geração, é obrigado a oferecer, nas guerras sem glória, contra povos inermes e quase sempre pacíficos, em nome disso ou daquilo, mas sempre provocadas pelos interesses dos saqueadores das riquezas alheias.

A situação tomou rumo novo, a partir dos anos 80, como apontou, em artigo publicado ontem por El Pais, o biólogo e filósofo catalão Federico Mayor Zaragoza, ex-ministro da Educação de seu país e, durante 12 anos, diretor-geral da Unesco. A aliança de interesses entre Reagan e Margareth Thatcher significou a capitulação do Estado diante do mercado, e se iniciou a era do verdadeiro terror, com 4 bilhões de dólares gastos a cada dia, em armamentos e outras despesas militares, e, a cada dia, 60 mil pessoas mortas de fome no mundo.

Mayor lembra a que levou o novo credo das elites, que Celso Furtado chamou de “fundamentalismo mercantil”: a melancólica erosão da ONU e sua substituição por grupos plutocráticos, como o grupo dos 7, dos 8 e, agora, sob a pressão dos emergentes, dos 20. E na pátria da nova fé nas “razões do mercado”, os Estados Unidos, há hoje 20 milhões de desempregados, 40 milhões de novos pobres e 50 milhões de pessoas sem qualquer seguro de saúde.

A Europa assediada e perplexa, com a falência de suas instituições políticas, está presa na armadilha do euro, que não tem como concorrer com o dólar nem com o yuan, porque yuan e o dólar são emitidos de acordo com a necessidade dos Estados Unidos e da China. Disso conseguiu escapar a Inglaterra, que mantém a sua moeda própria.

Os Estados Unidos, se não houver a reação, esperada, de seu povo, se preparam para manter o terror no mundo, mediante suas armas eletrônicas de alcance global, entre elas os aviões não tripulados. Seu destino, se assim ocorrer, será o do atirador solitário, que se compraz em assassinar os inocentes à distância, até que alguém consiga, com o mesmo método, abatê-lo. E não faltam os que se preparam para isso.


Sobre Wikileaks e Facebook




Combater as formas de exploração contemporâneas passa pela fuga dos mecanismos de identificação do sistema, mas também por sua sobrecarga, voltando suas lanternas insistentes contra as faces dos perseguidores paranoicos

Por Hugo Albuquerque, O Descurvo

A imagem acima já circulou bastante pela Rede. Nela, estão Julian Assange, criador de Wikileaks – a organização transnacional sem fins lucrativos que se prestou a desmascarar as tramoias da diplomacia americana pelo mundo – dizendo “Eu dou informação privada sobre as corporações para você de graça, e eu sou vilão” e Mark Zuckerberg – cabeça da popularíssima rede social Facebook – dizendo “Eu dou sua informação privada para as corporações por dinheiro, e eu sou o homem do ano”.

Recentemente, eu vi essa imagem no blog do Bruno Cava, usada por ele para demonstrar o que é “capitalismo cognitivo” – sim, uma imagem vale mais do que mil palavras, e esse chiste poupa algum tempo de explicação sobre as formas de exploração contemporâneas. Se o pós-fordismo é marcado pela virada do capitalismo ocidental em desenvolver sistemas de comunicação – e reproduzir nas suas redes, sua forma particular de exploração-, pensar sobre Wikileaks e Facebook, e seu papel nisso tudo, é fundamental.

A Internet, aliás, nunca esteve tão “social” quanto agora. As redes sociais engoliram a velha rede baseada na navegação livre e anônima, nos prendendo a uma territorialidade, que é o nosso próprio “perfil real”, isto é, à nossa identidade fora da rede, o que traz junto, por tabela, chefes, contatos, amigos, colegas de trabalho e escola/faculdade, além dos parentes – é a partir desse perfil que as pessoas passam a navegar, compartilhando links e fotos (suas vidas..), de tal modo que a navegação torna-se ancorada e identificada por definição.

Sempre se levantou a possibilidade de que os Estados, de repente, quisessem passar a identificar sistematicamente os usuários da Internet. Um temor com a sociedade disciplinar um tanto equivocado, uma vez que medidas desse tipo, quando aparecem, só o fazem como farsa – e nem possuem tanta efetividade assim, a julgar pela China. A sociedade de controle possui outros meios para regular o agir dos sujeitos, certamente, mais açucarados e sutis do que qualquer AI-5 Digital, embora elas devam ser combatidos também.

As redes sociais, de forma simpática e utilitária, colocam fim a necessidade do sistema identificar os usuários da rede de forma policialesca. E o Facebook é o top do top nesse esquema. Cada vez mais pessoas aderem à rede social de Zuckerberg e, diferentemente do fenômeno Orkut, não são apenas os mais jovens que estão usando o serviço, mas sim gente de todo o tipo.

O modo de exploração de Facebook volta-se à vida pessoal de seus usuários, seus afetos mais banais – aquilo que elas curtem, o que elas fizeram, quem elas amam etc -, tudo transferido para as corporações que, a partir de um perfil de consumo ultrafiltrado, vendem suas bugigangas. De repente, todas essas trocas de afetos desapareceriam se o site fechasse ou resolvesse apagar o que quisesse. Não existe produção explorada em um sentido clássico, mas a própria autoprodução do vivente em sua mais elementar sociabilidade.

Como qualquer mecanismo contemporâneo de exploração, até pela sua natureza de dispositivo de tecnologia de informação e de comunicação – como este blog, caro leitor -, é possível explorar sua natureza, escapar às suas finalidades e subverter-lhe com muito mais facilidade do que um bem de capital industrial. Talvez por isso, a disciplina, enquanto representação, não tenha desaparecido por completo – nem o Facebook se escuse de fornecer o nome de seus usuários “incômodos” para os governos.

Aí, entramos em Wikileaks, grande novidade de um ano atrás. O papel desempenhado por Assange vai em um sentido precisamente oposto, divulgando informações privadamente tratadas pelos Estados acerca da vida e dos destinos comuns. O financiamento? Meras doações para a sobrevivência da organização. O empoderamento gerado foi enormíssimo.

Não, não foi por conta de Wikileaks que aconteceu a Revolução dos Jasmins – faísca da Primavera Árabe -, mas por meio dele – do mesmo modo que o homem passou a andar a mais de 5 km por hora, não dependendo mais de carroças, não por conta da locomotiva, mas por meio dela e por conta da necessidade de se deslocar. Isso, a velha esquerda não compreende – ou não quer compreender, frustrada como está por conta do declínio do vanguardismo.

Combater as formas de exploração contemporâneas passa pela fuga dos mecanismos de identificação do sistema, mas também por sua sobrecarga, voltando suas lanternas insistentes contra as faces dos perseguidores paranoicos com espelhos, como fez Wikileaks – é preciso esvaziar e saturar a identificação ao mesmo tempo. Se Zuckerberg, derrotado no voto popular por Assange, foi eleito, ainda assim, homem do ano pela Time em 2011, certamente, 2012 é o ano do homem Assange com as corporações e os Estados postos em xeque – de Moscou até Washington.


Europa em crise (V): à espera de quem manda

Publicado em 11 de dezembro de 2011 por Antonio Martins




Em novo sinal eloquente de crise da política, governantes europeus evitam decisões claras e esperam que oligarquia financeira defina a sorte do euro

As duas características que marcam os atuais governos europeus — disposição de sacrificar direitos sociais, em favor da oligarquia financeira, e indecisão no curto prazo –voltaram a se manifestar na última quinta e sexta-feiras (8 e 9/12). Convocada para “salvar o euro”, uma reunião (“cúpula”) de chefes de Estado da União Europeia (UE) encerrou-se em Bruxelas, alcançando apenas acordos vagos.

Decidiu-se (sem a participação do Reino Unido e com nove governos “em consulta”) limitar os poderes das sociedades e Estados-membros no controle de seus próprios recursos públicos. Pretende-se que uma parcela ainda maior dos orçamentos (hoje destinada a itens como Previdência, garantia de direitos sociais e serviços públicos) seja desviada para pagamento de juros. Deseja-se transferir parte da gestão para a própria UE, que atuaria por meio de técnicos não submetidos a voto. Mas não se esclareceu como isso será feito. Também não se detalharam os meios para reforçar o fundo europeu constituído para evitar que países submetidos a ataques especulativos entrem em “moratória técnica”. Por isso, conforme afirmou com realismo o jornal madrilenho El País,” para saber se a reunião foi um êxito ou um fracasso, é preciso esperar o ditame dos mercados, a partir de segunda-feira”.

Quebrar a soberania fiscal dos Estados é o passo mais duro do vasto ataque que os mercados financeiros promovem contra uma sequência países europeus — Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha e Itália — ha cerca de um ano e meio. Endividados para socorrer os bancos, durante a crise de 2008 (e não para assegurar direitos sociais e serviços públicos), estes países enfrentam dificuldades crescentes para rolar seus compromissos. Obrigados a pagar taxas de juros cada vez mais altas, alguns viram-se à beira da insolvência. Receberam empréstimos de “resgate”, mas comprometeram-se com medidas como demissões de servidores, redução de pensões e aposentadorias (e ou aumento da idade mínima para obtê-los) e desmonte de serviços públicos. Como o ataque persiste, teme-se que em dado ponto os próprios “resgates” irão tornar-se impossíveis, o que precipitaria a “moratória técnica” de um país e, a partir dela, uma espiral de falências. Por isso, fala-se na nova medida.

Ela foi assumida explicitamente pela primeira vez em Paris, dia 5/12, numa reunião entre a chanceler alemã, Angela Merkel, e o presidente francês, Nicolas Sarkozy. Mas é complexa e difícil. Falou-se primeiro em reescrever o Tratado Europeu. Porém, como este passo poderia estender-se por meses, optou-se, ao longo da semana passada, por intervenções nas próprias Constituições dos países-membros da UE. Elas passariam a incorporar regras capazes de reservar parcela dos Orçamentos para pagamento dos juros, subordinando as demais despesas públicas. A UE fiscalizaria a imposição destas regras.

Em princípio, a ideia foi adotada, na reunião de 8 e 9/12. Porém, com incidentes e sem unanimidade. O primeiro-ministro do Reino Unido, David Cameron, exigiu, como estranha contrapartida à perda de soberania, que a “City”, grande centro financeiro de Londres, fosse isentada de eventuais regulamentações sobre os mercados financeiros. Não atendido, recusou-se a assinar o compromisso. Os chefes de Estado da Bulgária, República Checa, Dinamarca, Hungria, Letônia, Lituânia, Romênia e Suécia firmaram o pacto com ressalvas. Afirmaram que farão consultas a seus governos e parlamentos.

Por trás da ausência de consenso há um impasse político. Os governantes sabem que tanto a perda de soberania quanto os sacrifícios que ela implica tendem a ser muito antipopulares. Apresentam-na com eufemismos (“mais Europa”, “união mais profunda”), mas temem a resposta das urnas. Talvez por isso, a própria declaração final é vaga, ao estipular os próximos passos. Fala em mudanças constitucionais, mas não estabelece com clareza nem os mecanismos que deverão ser introduzidos, nem os prazos para adotá-las, nem os processos para fiscalizar e punir dos “faltosos”.

A reunião também não cumpriu a contento seu segundo objetivo. Em contrapartida à perda de soberania dos Estados, os governos que defendiam a medida falavam em ampliar o fundo europeu que deveria socorrer os países sob ataque especulativo. Também cogitava-se pressionar o Banco Central Europeu (BCE) para que atue no mesmo sentido, deixando de emprestar apenas aos bancos. Não houve acordo em torno de nenhuma das propostas, principalmente por oposição da Alemanha. Falou-se em algo oblíquo e insuficiente: países europeus (não se afirmou quais, nem se assumiram compromissos) emprestariam recursos ao FMI, e este os transferiria aos Tesouros em dificuldades. Mas nem o mecanismo para tanto é conhecido, nem os recursos (200 bilhões de euros) suficientes, caso prossiga o ataque contra Espanha e Itália.

Após a reunião, a Europa continua entre o péssimo e o pior. Caso os acordos se efetivem, ao longo dos próximos meses, haverá um enorme retrocesso antidemocrático, consolidando-se mecanismos que transferem riquezas dos “99,99%” para a oligarquia financeira e que impedem as sociedades — em plena era tecnológica das redes — de governarem a si mesmas.

Mas é possível que a irracionalidade dos mercados provoque novos ataques a países em dificuldades. A esta altura, e diante da impotência dos governos, isso significaria um grande terremoto financeiro. Dois momentos serão decisivos, para obter a resposta. O primeiro é a semana que começa amanhã (12/12), quando virão as primeiras reações à reunião de cúpula. O segundo é janeiro de 2012, quando a Itália terá de rolar algumas dezenas de bilhões de euros de sua dívida — sem que haja certeza de que poderá fazê-lo sem entrar em moratória. Em ambos os casos, as sociedades estarão — ainda — reduzidas à condição de espectadoras.


sábado, 17 de dezembro de 2011

Hit parade internacional prova inocência de Serra

Do Professor Hariovaldo:


Para terminar esta semana ingrata, uma música onde uma linda jovem canta em alto e bom som os motivos da inocência de José Serra, não que fosse preciso.



MAIS UM PASSO RUMO À PALESTINA LIVRE E SOBERANA




Desde 3ª feira, 13, a bandeira palestina tremula na sede parisiense daOrganização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. A Unesco é a primeira agência da ONU que reconheceu esse território como membro de pleno direito.

O ato solene contou com a presença da diretora-geral da Unesco, Irina Bokova, e do presidente palestino, Mahmoud Abbas, que destacou tratar-se do "primeiro reconhecimento para a Palestina", daí ter sido para ele tão "emocionante ver nossa bandeira hasteada hoje numa sede da ONU".

No final de outubro, quando a admissão da Palestina foi decidida, os EUA imediatamente retaliaram, o que me fez lembrar a puerilidade de comportamentos das turminhas de rua da minha meninice: 

"Por discordarem da admissão da Palestina como membro pleno, os EUA levarão a bola pra casa (no caso, os fundos de US$ 60 milhões que lhe destinavam), privando-a de 22% do seu orçamento bianual.

A entrada dos palestinos foi decidida por 107 votos a favor, 14 contra e 52 abstenções.

Ou seja, democraticamente, 62% dos países-membros aprovaram.

E, antidemocraticamente, uma das nações discordantes teve reação característica de mariquinha pirracento".

De resto, o estado de Israel parece determinado a impor aos outros exatamente o que seu povo sofreu: não só nega aos palestinos errantes o direito a uma pátria livre e soberana, como criou na faixa de Gaza uma versão atualizada do Gueto de Varsóvia.

A ponto de a música comemorativa do estabelecimento dos judeus na sua terra prometida, "Êxodus", agora cair como uma luva para suas vítimas, os palestinos:



"Eu vou pisar o chão que Deus me deu,
a terra que em sonhos vi.
O sol do amanhecer
mostrou-me o vale em flor,
que é todo meu, assim Deus prometeu.

Vem, meu amor, a terra conquistar,
aqui os nossos vão crescer.
Bem junto a ti eu sou
um homem e nada mais,
mas, se Deus quiser, um forte hei de ser.

Aqui farei meu lar.
Se Deus quiser que eu morra, eu morro sem chorar,
pois, afinal, vou ter meu lar".


by Náufrago da Utopia.



O desmonte da cultura paulista




Pelo menos para a cultura, o modelo de OS (Organização Social) está falido. Que o controle social se dê de outra forma. Será a única maneira de poupar a cultura paulista de esbirros autoritários, das suscetibilidades do universo cultural e do amadorismo de sucessivos secretários

Por Luis Nassif

Grupo de empresários paulistas financia programa de aprimoramento do ensino no estado, bancando consultoria da McKinsey.

Esse apoio só foi possível depois da entrada do governo Alckmin e da nomeação do Secretário Herman Voorwald. Na era Serra o governo tornou-ser totalmente impermeável a qualquer interação com a sociedade civil – até com empresários.

Mais que isso, o novo secretário conquistou a confiança dos empresários com ideias claras sobre educação, participação e formação dos alunos.

Faço essa introdução como contraponto ao que está acontecendo na área da Cultura.

O modelo de OS (Organização Social) foi completamente deturpado no setor. E o estilo Serra na prefeitura e no estado – ao contrário do que ocorreu na Saúde – seguiu a mais atrasada herança política brasileira: a terra arrasada sobre as estruturas já existentes.

Sob a inspiração de Cláudia Toni – que conquistou fama de terrível no meio cultural -, o primeiro Secretário de Cultura de Serra, João Sayad, desmontou a parte musical do estado. Não ficou pedra sobre pedra. Aliás, nem na Fundação Padre Anchieta, onde Toni teve a ousadia de demitir Julio Medaglia – uma notável unanimidade. Voltou atrás, depois, por decisão do governo do estado.

Outras pessoas a quem o estado devia enormes conquistas foram remoidas do cargo com humilhação. Foi assim com o maestro John Neschiling, da OSESP, com o maestro Neves, do Conservatório de Tatuí, Clodoaldo Medina, da Escola Livre de Música Tom Jobim.

Não apenas foram demitidos – alguns por carta, como Neves, que havia transformado Tatuí em referência nacional de música -, como, em muitos casos, recorreram-se a ataques sibilinos, insinuações sobre a seriedade das pessoas.

Procedeu-se à substituição das OSs sem nenhum critério. A Escola Livre de Música foi entregue à Universidade Santa Marcelina que, embora reputada, é concorrente. Ambas, a Tom Jobim e a Santa Marceliina, disputam o mesmo universo de alunos.

No início, Cláudia pretendia juntar todas as orquestras de São Paulo – Jazz Sinfônica, Orquestra Jovem – sob uma mesma formação. Embora filha do respeitado e querido maestro Oliver Toni, a ânsia da “refundação” era tamanha que sequer levou em consideração as diferenças de formação, estilo e gosto dos músicos de cada orquestra.

Essa loucura não prosperou, mas entregou-se a Jazz Sinfônica para a Organização Social de Cultura Associação Paulista de Amigos da Arte, que jamais teve experiência prévia na administração de orquestras.

A administração de orquestras exige formação especial e experiência prévia. Envolve egos, logística, viagens, programação. Abriu-se mão do principal gestor de orquestras do país, Clodoaldo, meramente pelo desejo da “refundação”.

Não apenas isso.

Foi encomendado um diagnóstico para quatro universidades, que dividiram a formação musical em inclusão social, formação técnica (do instrumentista) e formação superior (com orquestração, história da música etc). A primeira etapa seria do Projeto Guri (tirando da politização imposta na gestão Mendonça); a segunda, dos conservatórios; a terceira, das universidades.

Na prática, foi um desmonte. Pegou-se o notável Conservatório de Tatuí, que dava formação técnica aos alunos, e lotou-se o currículo com matérias teóricas próprias de curso superior. Nem cuidaram de analisar as expectativas dos alunos.

O resultado foi a redução significativa do número de alunos.

Agora, no seu curto interinato, Andréa Matarazzo planeja uma nova “refundação”. Pretende tirar as orquestras da Associação Paulista de Amigos da Arte e entregá-las ao Instituto Pensarte, que jamais administrou uma orquestra. Todo o tempo perdido no aprendizado da APAA é jogado fora, todos os músicos são despedidos, para serem recontratados por uma nova OS e começa-se tudo de novo.

O governador Alckmin, que conseguiu avançar na Educação, precisa voltar os olhos para a cultura do Estado.

Pelo menos para a cultura, o modelo de OS está falido. Dia desses conversei com um desanimado músico de orquestra paulista. A única coisa que pedem é uma estrutura que não atrapalhe, que dê conta da parte administrativa sem a descontinuidade dos últimos anos, nesse amadorismo da “refundação” permanente”.

Que o controle social se dê de outra forma. Cada orquestra volte a ter sua personalidade jurídica própria, submetida a um conselho de notáveis que representem os olhos da sociedade civil. Será a única maneira de poupar a cultura paulista de esbirros autoritários, das suscetibilidades do universo cultural e do amadorismo de sucessivos secretários.


A voz do povo e a surdez de seus representantes



O atendimento público à saúde é a área do governo que sofre as maiores críticas da população: 67% dos entrevistados pela pesquisa da CNI/Ibope, divulgada esta semana, reprovam o atendimento do setor. 
O número é particularmente destoante comparado ao salto de 51% para 56% no apoio geral ao governo Dilma. 
Mas sobretudo destoa constatar que nos dias que antecederam a pesquisa, o Senado brasileiro --com apoio da bancada do governo-- rejeitou, a exemplo do que já fizera a Câmara, a criação de um imposto sobre transações financeiras --de insignificantes 0,01%-- para reforçar o orçamento notoriamente deficitário da saúde pública. 
Diz algo sobre o esgotamento da democracia representativa que 67% da população aponte uma emergência e que seus supostos representantes a ignorem. 
Em 2007, derrotada nas urnas presidenciais no ano anterior, a coalizão demotucana, com intensa vocalização de seu dispositivo midiático, extinguiu a CPMF subtraindo R$ 40 bi à saúde. 
O Brasil investe no setor uma proporção do PIB três vezes inferior à da França.

(Carta Maior; Sábado; 17/12/ 2011)



Europa em crise (IV): os Bancos Centrais e a oligarquia financeira

Publicado em 8 de dezembro de 2011 por Antonio Martins




No intervalo de apenas duas semanas, o Banco Central Europeu adotou atitudes opostas diante de problemas semelhantes. Veja por que esta assimetria é reveladora

Todos os bancos centrais procuram apresentar-se como órgãos “neutros”. O pensamento econômico ortodoxo sustenta, aliás, que, para poderem proteger as moedas com eficácia, os BCs devem ser “preservados” inclusive da “interferência” de governantes eleitos. Neste caso, a técnica é vista como mais importante que a democracia. Mas… que fazer quando se revela a parcialidade e a interferência política destas instituições supostamente tão soberbas?

É o que está ocorrendo neste exato momento na Europa, diante dos olhos de todos. Na manhã de hoje, o Banco Central Europeu (BCE) anunciou um conjunto de medidas que beneficiam as instituições financeiras privadas. Suspeita-se que as decisões tenham sido tomadas em regime de urgência, para evitar um incidente devastador — por exemplo, a quebra de um grande banco europeu, capaz de se propagar rapidamente na forma de falências em cadeia.


São três as principais novidades anunciadas:

a) o BCE reduziu ainda mais a taxa de juros, nos empréstimos aos bancos. Ela caiu de 1,25% para 1% ao ano. Conforme lembra Ignacio Ramonet, as instituições financeiras podem tomar euros do BCE, a esta taxa muito rebaixada, e emprestar imediatamente a países como Espanha e Itália, cobrando algo em torno de 7%. Como os volumes são imensos, os ganhos são fabulosos;

b) uma nova linha de crédito, com prazo de três anos para pagamento, será aberta pelo BCE em favor dos bancos europeus. Especula-se que a medida é necessária porque alguns deles estão precisando desesperadamente de dinheiro;

c) para obter estes empréstimos, os bancos não precisarão mais oferecer garantias sólidas. O BCE anunciou que aceitará um leque muito maior de papéis, inclusive hipotecários, considerados de difícil cobrança e muito desvalorizados, nas próprias transações entre os bancos. Em outras palavras, o BCE aceita assumir grandes prejuízos das instituições financeiras privadas.

Mesmo antes de decretadas condições tão confortáveis, os bancos já vinham recorrendo pesadamente à generosidade do BCE. Só entre 30 de novembro e ontem, informa The Economist, eles tomaram emprestados 50,7 bilhões de euros. Aqui, aparece a primeira grande assimetria. Em conjunto com a União Europeia (UE), o banco central tem se negado, sistematicamente, a apoiar os países em dificuldades. O caso mais clássico é a Grécia. Cada parcela de 8 bilhões de euros do empréstimo prometido ao país é negociada, às vezes, ao longo de meses. UE e BCE impõem condições: definem que empresas públicas gregas devem ser privatizadas, e que direitos sociais serão extintos. O governo e o parlamento acatam, humilhados.

O BCE também poderia ajudar Espanha e Itália, que ainda não se submeteram tão profundamente quanto a Grécia. Estes países enfrentam dificuldades para rolar sua dívida junto aos credores privados. São obrigados a pagar taxas de juros cada vez mais altas. Para socorrê-los, bastaria que o BCE comprasse os papéis esnobados pela finança privada. Nada: ainda hoje, o presidente do banco, Mario Draghi, voltou a afirmar que a hipótese de uma compra relevante está fora de cogitação.

Qual a lógica de tal discrepância? Por que o BCE empresta dezenas de bilhões de euros aos bancos, cobrando 1% ao ano e aceitando títulos podres como garantia; e não pode fazer o mesmo em favor da Itália e Espanha, que são há décadas pagadores confiáveis?

Em tempos de crise, não é difícil encontrar certas respostas. Ao cobrir uma reunião entre Angela Merkel e Nicolas Sarkozy, na última segunda-feira (5/12), o correspondente do Financial Times em Frankfurt escreveu: “O BCE diminuiu ainda mais o ritmo de sua compra de bônus [emitidos pelos governos]. As operações nos últimos sete dias totalizaram € 3,7 bilhões (…) Na semana passada, o BCE estava tentando manter o máximo de pressão sobre os políticos”.

A frase desmascara a suposta neutralidade e parece dar razão a Patrick Viveret. Já não é possível entender a crise e a política atuais sem levar em conta o surgimento de uma “oligarquia financeira global”. Trata-se de um pequeno conjunto de instituições e executivos muito poderosos, que exercem influência cada vez maior sobre as decisões políticas dos países mais ricos e centrais. Esta casta investe cada vez mais agressivamente contra dois elementos essenciais da democracia: a diversidade de opiniões e o tempo necessário para decidir refletidamente.

Num outro texto recente, Ignacio Ramonet alerta: esta investida pode ser o prenúncio de regimes que deveriam ser caracterizados como “democracias autoritárias”. Ou, numa única palavra, democraduras.



sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Hora de rever as privatizações



Se outros efeitos não causar à vida nacional o livro do jornalista Amaury Ribeiro Jr., suas acusações reclamam o reexame profundo do processo de privatizações e suas razões. 
A presidente da República poderia fazer seu o lema de Tancredo: um governante só consegue fazer o que fizer junto com o seu povo.

por Mauro Santayana, na Carta Maior


Se outros efeitos não causar à vida nacional o livro do jornalista Amaury Ribeiro Jr., suas acusações reclamam o reexame profundo do processo de privatizações e suas razões. Ao decidir por aquele caminho, o governo Collor estava sendo coerente com sua essencial natureza, que era a de restabelecer o poder econômico e político das oligarquias nordestinas e, com elas, dominar o país. A estratégia era a de buscar aliança internacional, aceitando os novos postulados de um projetado governo mundial, estabelecido pela Comissão Trilateral e pelo Clube de Bielderbeg. Foi assim que Collor formou a sua equipe econômica, e escolheu o Sr. Eduardo Modiano para presidir ao BNDES - e, ali, cuidar das privatizações.

Primeiro, houve a necessidade de se estabelecer o Plano Nacional de Desestatização. Tendo em vista a reação da sociedade e as denúncias de corrupção contra o grupo do presidente, não foi possível fazê-lo da noite para o dia, e o tempo passou. O impeachment de Collor e a ascensão de Itamar representaram certo freio no processo, não obstante a pressão dos interessados.

Com a chegada de Fernando Henrique ao Ministério da Fazenda, as pressões se acentuaram, mas Itamar foi cozinhando as coisas em banho-maria. Fernando Henrique se entregou à causa do neoliberalismo e da globalização com entusiasmo. Ele repudiou a sua fé antiga no Estado, e saudou o domínio dos centros financeiros mundiais – com suas conseqüências, como as da exclusão do mundo econômico dos chamados “incapazes” – como um Novo Renascimento.

Ora, o Brasil era dos poucos países do mundo que podiam dizer não ao Consenso de Washington. Com todas as suas dificuldades, entre elas a de rolar a dívida externa, poderíamos, se fosse o caso, fechar as fronteiras e partir para uma economia autônoma, com a ampliação do mercado interno. Se assim agíssemos, é seguro que serviríamos de exemplo de resistência para numerosos países do Terceiro Mundo, entre eles os nossos vizinhos do continente.

Alguns dos mais importantes pensadores contemporâneos- entre eles Federico Mayor Zaragoza, em artigo publicado em El País há dias, e Joseph Stiglitz, Prêmio Nobel de Economia - constataram que o desmantelamento do Estado, a partir dos governos de Margareth Thatcher, na Grã Bretanha, e de Ronald Reagan, nos Estados Unidos, foi a maior estupidez política e econômica do fim do século 20.

Além de concentrar o poder financeiro em duas ou três grandes instituições, entre elas, o Goldman Sachs, que é hoje o senhor da Europa, provocou o desemprego em massa; a erosão do sistema educacional, com o surgimento de escolas privadas que só servem para vender diplomas; a contaminação dos sistemas judiciários mundiais, a partir da Suprema Corte dos Estados Unidos – que, entre outras decisões, convalidou a fraude eleitoral da Flórida, dando a vitória a Bush, nas eleições de 2000 -; a acelerada degradação do meio-ambiente e, agora, desmonta a Comunidade Européia.

No Brasil, como podemos nos lembrar, não só os pobres sofreram com a miséria e o desemprego: a classe média se empobreceu a ponto de engenheiros serem compelidos a vender sanduíches e limonadas nas praias.

É o momento para que a sociedade brasileira se articule e exija do governo a reversão do processo de privatizações. As corporações multinacionais já dominam grande parte da economia brasileira e é necessário que retomemos as atividades estratégicas, a fim de preservar a soberania nacional.

É também urgente sustar a incontrolada remessa de lucros, obrigando as multinacionais a investi-los aqui e taxar a parte enviada às matrizes; aprovar legislação que obrigue as empresas a limpa e transparente escrituração contábil; regulamentar estritamente a atividade bancária e proibir as operações com paraísos fiscais. É imprescindível retomar o conceito de empresa nacional da Constituição de 1988 – sem o que o BNDES continuará a financiar as multinacionais com condições favorecidas.

A CPI que provavelmente será constituída, a pedido dos deputados Protógenes Queiroz e Brizola Neto, naturalmente não se perderá nos detalhes menores – e irá a fundo na análise das privatizações, a partir de 1990, para que se esclareça a constrangedora vassalagem de alguns brasileiros, diante das ordens emanadas de Washington.
Mas para tanto é imprescindível a participação dos intelectuais, dos sindicatos de trabalhadores e de todas as entidades estudantis, da UNE, aos diretórios colegiais. Sem a mobilização da sociedade, por mais se esforcem os defensores do interesse nacional, continuaremos submetidos aos contratos do passado. A presidente da República poderia fazer seu o lema de Tancredo: um governante só consegue fazer o que fizer junto com o seu povo.


Mauro Santayana é colunista político do Jornal do Brasil, diário de que foi correspondente na Europa (1968 a 1973). Foi redator-secretário da Ultima Hora (1959), e trabalhou nos principais jornais brasileiros, entre eles, a Folha de S. Paulo (1976-82), de que foi colunista político e correspondente na Península Ibérica e na África do Norte
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No fundo do La Casserole


O Tijolaço continua fazendo 'furos' na blindagem da mídia.


O La Casserole, que recebeu ontem, em hora indigesta, Ricardo Sérgio e altos tucanos

A jornalista Maria Cristina Fernandes, do Valor, é a primeira, nos grandes jornais, a escrever, pondo o nome embaixo, que a imprensa está boicotando não apenas o livro, mas o tema trazido, de novo, à tona, pelo A Privataria Tucana.

O seu artigo, exclusivo para assinantes na página do jornal, foi reproduzido aqui.
Merece aplauso, e não há reparo algum a fazer na sua conclusão que não é apenas o tucanato que se escafede do tema.

Mas merecem destaque algumas informações, sabidas e esquecidas, que ela publica, sem medo de patrulhas.

Por exemplo, que uma única operação da Polícia Federal achou US$ 30 milhões mandados para fora por contas CC-5, um dos portões apontados por Amaury.

Ou que o impasse sobre acusações a Gustavo Franco e a Henrique Meirelles fez empacar a CPI do Banestado, cujos documentos, em parte, por uma destas circunstâncias que se pode atribuir à Providência, vieram às mãos de Amaury Ribeiro, justamente por ter de responder ao processo que lhe moveu Ricardo Sérgio de Oliveira, o homem a quem a Veja chamou de “coletor” das campanhas de José Serra.

E, como noticiar fatos não ofende, publica também que, nestes indigestos dias, reuniram-se ontem num dos mais bem afamados restaurantes franceses da Paulicéia, o La Casserole, o indigitado Ricardo Sérgio, o chefe da Casa Civil do governo FHC, Clóvis Carvalho, e José Carlos Dias, ministro da Justiça efeagáciano e parceiro em muitas causas de Arnaldo Malheiros, advogado de José Serra.

Como disse Paulo Preto, não se abandona um amigo na beira da estrada.

PS. A blogosfera, como diz Fernandes, está realmente dedicando um tempo imenso ao livro do Amaury. Pudera, com todas as nossas limitações – será que alguém imagina que um blogueiro possa pegar o telefone e pedir uma entrevista a estes personagens, como podem fazer os repórteres de jornal ? – estamos tentando apurar e revelar os fatos que a grande imprensa segue mantendo nas sombras.



Um imagem vale mais que mil palavras



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Na mesma praça, no mesmo banco…USP









O autoritarismo do reitor João Grandino Rodas e a surdez da mídia para as reivindicações estudantis viram piada no vídeo “A USP é Nossa”

A política não precisa ser chata — e a política universitária menos ainda. Para driblar os discursos exaltados e as palavras de ordem, que costumam causar ojeriza em muita gente, um grupo de estudantes da Universidade de São Paulo resolveu lançar mão do humor. Assim, produziram A USP É Nossa, um vídeo curtinho, com menos de quatro minutos, que se baseia no clássico do SBT para criticar o autoritarismo do reitor João Grandino Rodas e a maneira como os meios de comunicação tradicionais manipulam as exigências do Movimento Estudantil.

“Muitas pessoas já lançaram mão de piadas para falar de política, e com bastante êxito. Acreditamos que o humor e o entretenimento podem ser muito eficazes para transmitir uma mensagem, fazer com que as pessoas pensem e saiam da anestesia em que se encontram”, diz Murilo Alvesso, estudante da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP e um dos idealizadores do vídeo. Murilo conta que A USP É Nossa é uma iniciativa coletiva dos alunos do curso de Audiovisual. Em greve desde a desocupação da Reitoria pela tropa de choque, o grupo tem discutido estratégias de ação política para fortalecer o movimento grevista e dialogar com a sociedade. Daí surgiu a ideia de reunir alguns atores, um par de câmeras e levar tudo pra uma das muitas áreas verdes da Cidade Universitária, na Zona Oeste de São Paulo. O resultado está disponível no YouTube.

No vídeo, Rodas e um estudante aparecem sentados num banco de praça. Assim como Carlos Alberto de Nóbrega no programa do SBT, o reitor está lendo uma revista — e se irrita quando o estudante diz que quer a PM fora do campus e uma política de segurança estruturada. Rodas ameaça chamar a força policial para dar uma “aula de democracia” no aluno impertinente quando entra em cena a Dona Mídia, paródia da Velha Surda. Daí podemos imaginar a desinformação que será veiculada pelos jornais do dia seguinte, pois a distinguida senhora não consegue escutar direito o que o estudante está dizendo. Aliás, em A USP É Nossa, Rodas e Dona Mídia trocam afagos como grandes amigos.

“Já que não temos o alcance do Datena ou da Globo, queremos contar nossa versão da história utilizando a internet”, diz Murilo, para quem os grandes meios de comunicação foram tendenciosos na cobertura da desocupação da Reitoria, reduzindo as exigências do Movimento Estudantil a uma questão trivial entre a proibição de fumar maconha no campus e a suposta articulação dos manifestantes com traficantes de drogas dos arredores. “Nossas reivindicações foram distorcidas. Por isso é que estamos buscando novas maneiras de transmitir nossas ideias.”