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sexta-feira, 12 de abril de 2013

Sobre ENEM e erros no uso da língua escrita!

Bem poderia ter sido escrito numa prova do ENEM. E daí?

Erros comuns no Enem aparecem diariamente nas páginas dos jornais
Sírio Possenti
Sem nenhum esforço especial, podem ser encontradas nos jornais construções que, se ocorressem em redações do ENEM, causariam escândalo. “Especialistas” em língua como os apresentadores de jornais diriam dizer que se trata de erros escandalosos. 
Por exemplo:
“Isso são coisas de muito antes, antes de descobrir que o que eu gostava mesmo era de arte, e não de morte”, escreveu Alexandre Barbosa de Souza (“Laranjas de fim e noite”, Ilustríssima, Folha de S. Paulo – FSP, doravente – de 07/04/3013). “O que eu gostava” violaria a regência de “gostar”, que aqueles sábios resolvem assim: se é gostar de, então se deve dizer do que eu gostava. Eles afirmam isso a seco, sem considerar o fato de que se trata de uma relativa, e que, neste contexto, o fenômeno da queda da preposição é quase regular, independentemente da escolaridade do usuário e de o texto ser escrito e monitorado, isto é, cuidado (deve ter sido revisado, reescrito). O restante do texto mostra claramente que não é um exemplo de informalidade.
Outro dato: “Digo “nova edição” porque existia uma antiga (…) que li e não gostei” (João Pereira Coutinho, Os canalhas da humanidade, FSP 9/4). Um daqueles corretores, ou caçadores de erros, diria que o filósofo português deveria ter escrito “de que não gostei”. Pelas mesmas razões.
Ainda outro (de uma coluna do caderno Esporte da mesma FSP, de cujo autor apaguei o nome…): “… mas o que me lembro é que naquele dia a torcida cantou …”. De novo, um corretor de caneta vermelha em punho, leitor de análises fajutas, dono de um manual de erros e acertos, vai repetir que a regência de “lembrar” ou é “lembro que” ou “me lembro de que”, mas não pode ser “me lembro que”. Como isso cansa!
Mais um, de outro domínio: “Há, porém, equívocos, que se acumulam nas incursões diplomáticas que houveram”, escreveu Arnaldo Carrilho (“Acúmulo de equívocos”, FSP de 6/4/2013- na Seção Debates, que é bem solene). “Haviam” não ocorreu numa das tais redações, causando escândalo? Está na hora de tratar deste caso como se trata de outros, p. ex., “tudo são flores”. Também há questões de sentido envolvidas, especialmente a proximidade de “haver” com “acontecer”, “ocorrer”, que são plurais. Chega de pensar que é o domínio desta regra que torna alguém um intelectual profundo…
A lista pode ser sempre aumentada todos os dias. O que ela mostra? Uns dirão que mostra a decadência da língua: nem mesmo os cultos escrevem direito. Mas se esses sujeitos estudassem um pouco, concluiriam duas outras coisas: a) mesmo a norma culta escrita é variável – como todas as línguas; b) os ditos erros não são provas de decadência, mas prova de que pobres e ricos, cultos e incultos se igualam em muitos pequenos domínios de uma língua, exatamente aqueles em que ela aceita regras alternativas.
Mas é claro que é mais fácil condenar jovens que fazem provas, especialmente se são patrocinadas pelo governo ao qual se faz oposição.


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