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terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Villa, o PSTU da direita


Há uma característica comum aos artigos de Marco Antonio Villa, critique Lula ou FHC: a mediocridade absoluta, indecorosa, ofensiva a qualquer forma de inteligência.
O debate público brasileiro já contou com radicais terríveis, como Olavo de Carvalho. O radicalismo entranhado necessita de brilho para ser digerido. E Olavo dá esse brilho. Outros intelectuais aproveitaram a demanda por radicais da velha mídia para emprestarem seu nome a afirmações oportunistas. Mas recheavam as declarações com um mínimo de embasamento.
Mas Villa é um acinte pela mediocridade tosca, vazia. Só conseguiu o espaço que tem pela reduzida oferta de intelectuais dispostos a falar para o Homer Simpson perseguido pela mídia. De quem dá espaço para ele, só resta a mesma avaliação de Chico Buarque para o intelectual que dirigia a Veja (após ler o seu livro): bem feito!

Luís Nassif


by Com Texto Livre.



Mídia, hipocrisia, ou mentiras ideológicas no seu café da manhã



Fato 1:

*DILMA DESPACHA UM TORPEDO CONTRA A HIPOCRISIA CONSERVADORA :

"Nós começaremos a conversar sobre direitos humanos em Guantánamo.Não é possível usar direitos humanos como uma arma política e ideológica". 

(Presidenta Dilma, 3ª feira, 31-01,em Havana)

Opinião de Carta Maior:

CUBA, MÍDIA E HIPOCRISIA

A Folha desta 3ªfeira dedica meia página da Ilustrada a entrevista com ilustre escritora cubana desconhecida. Sem piscar, nem engasgar, lá pelas tantas, Zoé Valdés, que vive em Paris, afirma que o regime de Fulgência Batista era mil anos luz melhor que o de Fidel Castro. Passemos. 
Na 'totalitária' Cuba uma Comissão de Direitos Humanos convocou ontem uma coletiva de imprensa internacional, livremente realizada (será que na sempre poupada Arábia Saudita isso seria possível?). Colocou à disposição dos jornalistas a viúva de um suposto dissidente morto após greve de fome. O motivo original da prisão, reconhecido pela viúva, não foi político, mas uma briga de casal, que levou sua mãe a pedir socorro aos vizinhos e estes à polícia. Nota da União Patriótica Cubana, de oposição, admite que o 'estreitamento de laços' do suposto dissidente com a UPC só teria ocorrido após a prisão. No mínimo nebuloso, este é o caso em torno do qual a mídia demotucana tentou transformar a visita oficial da Presidenta Dilma a Havana num constrangimento diplomático. 
O jornal O Globo, como se sabe um veículo de impecável tradição democrática, reclama, também na edição desta 3ª feira, que a entrevista coletiva da viúva teve a participação da imprensa oficial cubana, cujas perguntas provocaram, digamos assim, ruídos na narrativa conservadora do caso. 
Carta Maior defende a democracia em todas as latitudes e considera incompatível o socialismo sem soberania popular, mas não compactua com a hipocrisia midiática que subestima a inteligência do leitor e menospreza a História.

(Carta Maior; 3ª feira; 31/01/ 2012)


Pressão arterial deve ser medida nos dois braços, mostra revisão de estudos


Valores diferentes podem indicar risco de doença vascular periférica no paciente


No Brasil, diferença-limite na medição de pressão
entre os braços é de 20 mm Hg
SÃO PAULO - Uma revisão de 28 estudos publicada nesta segunda-feira, 30, na versão online da revista The Lancet aponta que os médicos deveriam medir a pressão arterial nos dois braços do paciente - e não apenas em um, como ocorre na maioria dos consultórios. Isso porque medidas diferentes de pressão nos braços podem indicar risco aumentado de doença vascular periférica.
Medir a pressão nos dois braços já é recomendado nas diretrizes de hipertensão da Sociedade Brasileira de Cardiologia - a última atualização foi publicada em 2010. A norma orienta que na primeira consulta os médicos meçam a pressão nos quatro membros do paciente: nos dois braços e nas duas pernas - o que nem sempre acontece.
A revisão de estudos foi conduzida pelo médico Christopher Clark, da Universidade Exeter (Grã-Bretanha), e demonstrou também que uma diferença de pressão sistólica acima de 15 milímetros de mercúrio (mm Hg) entre os dois braços está associada ao maior risco de ter uma das artérias parcialmente obstruída.
Seria o caso, por exemplo, de um paciente ter a pressão arterial de 120 mm Hg por 80 mm Hg (12 por 8) em um dos braços e de 140 mm Hg por 80 mm Hg (14 por 8) no outro. A diferença de 140 para 120 é 20. Segundo o estudo, nesses casos o paciente deveria ser encaminhado para exames mais específicos.
Aqui no Brasil, as diretrizes recomendam uma investigação mais aprofundada apenas nos casos em que a medição da pressão apresentar uma diferença superior a 20 mm Hg entre os dois braços. Para o cardiologista Luiz Aparecido Bortolotto, diretor da Unidade Clínica de Hipertensão do InCor, esse é um ponto que poderá ser reavaliado no País.
“Uma das coisas mais importantes desse estudo é que a diferença de pressão entre os dois braços a ser considerada perigosa é de 15, enquanto aqui no Brasil o valor é 20. Talvez a gente tenha de rever as diretrizes e também baixar esse número”, diz.
Exame clínico
Para o cardiologista Marcelo Ferraz Sampaio, chefe do Laboratório de Biologia Molecular do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, a revisão de estudos vem reforçar a necessidade de os médicos fazerem um exame clínico bem feito e mais demorado.
“Medir a pressão nos dois braços faz parte do bom exame clínico e faz parte da diretriz. O problema é que no sistema acelerado de atendimento muitos médicos não fazem o exame corretamente por pressa”, avalia.
A mesma opinião é compartilhada pela cardiologista Fernanda Consolim Colombo, diretora da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp). “Os resultados chamam a atenção para a necessidade de os médicos fazerem o melhor exame físico possível no paciente, independentemente da queixa. Esse exame é o momento em que o médico pode surpreender uma doença assintomática como a hipertensão”, diz Fernanda.
Para medir a pressão corretamente, o paciente deve estar sentado, descansado, de bexiga vazia e não deve ter fumado.


A Escala F



VLADIMIR SAFATLE

Na década de 50, o filósofo alemão Theodor Adorno (1903-1969) uniu-se a um grupo de psicólogos sociais norte-americanos para desenvolver um estudo pioneiro sobre o potencial autoritário inerente a sociedades de democracia liberal, como os Estados Unidos.

O resultado foi, entre outras coisas, um conjunto de testes que permitiam produzir uma escala (conhecida como Escala F, de "fascismo") que visava medir as tendências autoritárias da personalidade individual.

Por mais que certas questões de método possam atualmente ser revistas, o projeto do qual Adorno fazia parte tinha o mérito de mostrar como vários traços do indivíduo liberal tinham profundo potencial autoritário.

O que explicava porque tais sociedades entravam periodicamente em ondas de histeria coletiva xenófoba, securitária e em perseguições contra minorias.

O que Adorno percebeu na sociedade norte-americana vale também para o Brasil. Na semana passada, esta Folha divulgou pesquisa mostrando como a grande maioria dos entrevistados apoia ações truculentas como a internação forçada para dependentes de drogas e intervenções policiais espetaculares como as que vimos na cracolândia.

Se houvesse pesquisa sobre o acolhimento de imigrantes haitianos e sobre a posição da população em relação à ditadura militar, certamente veríamos alguns resultados vergonhosos.

Tais pesquisas demonstram como a idealização da força é uma fantasia fundamental que parece guiar populações marcadas por uma cultura contínua do medo.

É preferível acreditar que há uma força capaz de "colocar tudo em ordem", mesmo que por meio da violência cega, do que admitir que a vida social não comporta paraísos de condomínio fechado.

Sobre qual atitude tomar diante de tais dados, talvez valha a pena lembrar de uma posição do antigo presidente francês François Mitterrand (1916-1996).

Quando foi eleito pela primeira vez, em 1981, Mitterrand prometera abolir a pena de morte na França. Todas as pesquisas de opinião demonstravam, no entanto, que a grande maioria dos franceses era contrária à abolição.

Mitterrand ignorou as pesquisas. Como se dissesse que, muitas vezes, o governo deve levar a sociedade a ir lá aonde ela não quer ir, lá aonde ela ainda não é capaz de ir. Hoje, a pena de morte é rejeitada pela maioria absoluta da população francesa.

Tal exemplo demonstra como o bom governo é aquele capaz de reconhecer a existência de um potencial autoritário nas sociedades de democracia liberal e a necessidade de não se deixar aprisionar por tal potencial.



segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Bicadas no reino dos tucanos: FHC X Serra

Do Blog de Magno Martins

FHC perde a paciência: "Minha cota de Serra já deu"



"A minha cota de Serra deu. Ele foi duas vezes meu ministro, duas vezes candidato a presidente, candidato a governador e a prefeito. Chega, não tenho mais paciência com ele". O desabafo do ex-presidene Fernando Henrique, segundo o jornal Correio Braziliense de ontem, foi feito a pelo menos dois interlocutores, semanas antes da famosa entrevista à revista The Economist, na qual aponta Aécio Neves como candidato natural do PSDB à campanha presidencial de 2014. Serra é pressionado pelos tucanos para ser candidato do partido à prefeitura da São Paulo, mas recusa terminantemente, com a obsessão de enfrentar Dilma novamente em 2014. Fora Serra, o PSDB não tem um nome 'decisivo' para disputar e vencer em S.Paulo.


Visão estreita - O que impacienta o PSDB não é apenas o fato de o comando do partido em São Paulo estar concentrado apenas em duas mãos. Irrita profundamente os filiados a constatação de que nem Alckmin nem Serra podem ser considerados lideranças empolgantes. O primeiro é visto como um governador provinciano e caipira. Faz questão de ligar pessoalmente para prefeitos e discutir convênios firmados pelo governo estadual. “Ele não saiu de Pindamonhangaba ainda (terra onde começou a carreira política). Quando foi deputado federal, parecia um vereador”, provocou um aliado de José Serra.




Bicadas no reino dos tucanos: Villa x Graziano



"Marco Antonio Villa, o maquiavel mequetrefe"
By Xico Graziano, no seu blog.

Um artigo esdrúxulo artigo foi publicado pelo historiador Marco Antonio Villa no Estadão deste sábado (28/01). Para argumentar que a oposição está sem rumo, inicia por dizer que FHC faz uma análise “absolutamente equivocada da conjuntura brasileira”. Não é que o professor discorda disso ou daquilo, contrapondo opiniões, o que seria normal. Não. Ele acha que FHC não entende “absolutamente” nada da política nacional. Que empáfia!

Eu li e fiquei pensando: mas que pretensão exagerada. Quem é esse iluminado, um fenômeno acadêmico, um sabichão, que simplesmente zera a capacidade de análise política de FHC, coisa que nem seus maiores adversários ousam fazer?

Para provar que FHC nunca foi bom na política, o vaidoso professor arrola 6 episódios históricos. Pois eu estive presente, ao lado de FHC, em todos eles. E posso afirmar, e provar com documentos e depoimentos, que todas as interpretações oferecidas no artigo estão maldosamente equivocadas. Eu desafio o professor Villa para um debate público sobre aqueles episódios para ver se ele sustenta as bobagens que escreveu.

Ao criticar a oposição, e especialmente o PSDB, o pedante professor enfrenta a situação, taxada por ele como uma “cruel associação do grande capital com os setores miseráveis”, que periga se perpetuar no poder. Quer dizer, o homem é contra o governo do PT. Conclusão: mais que o famoso “fogo amigo” da política, o arrogante historiador se coloca acima do bem e do mal, posa de conselheiro do rei.

Essa espécie de Maquiavel mequetrefe não percebe, em seus delírios intelectuais, que sua mente está impregnada das velhas idéias da política, formuladas no século passado sob o dogma da dualidade que opõe a esquerda com a direita, a situação contra oposição, o povo contra as elites, utilizadas até hoje, é verdade, pelos últimos populistas, ou autoritários, que vivem de iludir e mandar no povo. Mas eles desaparecerão.

Tal referencial de análise está ultrapassado pelo fim das ideologias totalizantes, pela globalização da economia, pela crise ambiental, pela luta em favor da diversidade humana, pela defesa da paz e da tolerância, contra a violência e as drogas, pela ascensão das classes sociais, pelas modernas formas de comunicação determinadas nas redes sociais via internet. A democracia e o sistema republicano, incluindo os partidos, precisam se renovar, se abrir, para capturar a demanda que brota da juventude na era digital.

É por aqui, pelos caminhos dessa nova agenda imposta à reflexão na civilização humana, que perpassa o pensamento de FHC, mesmo quando analisa a realidade política brasileira. Por isso que o professor Marco Antonio Villa, contaminado pelos vícios do passado, não consegue entender nada, e escreve besteira. Paciência.

Para que os leitores formem seu juízo,  o Lírio Verde coloca abaixo o artigo criticado. Entre tucanos, bicadas são comuns.


Oposição sem rumo

MARCO ANTONIO VILLA - O Estado de S.Paulo

Nesta semana fomos surpreendidos por uma entrevista de Fernando Henrique Cardoso. Não pela entrevista, claro, mas pela análise absolutamente equivocada da conjuntura brasileira. Esse tipo de reflexão nunca foi seu forte. Basta recordar alguns fatos.

Em 1985 iniciou a campanha para a Prefeitura paulistana tendo como aliados o governador Franco Montoro e o governo central, que era controlado pelo PMDB, além da própria Prefeitura, sob o comando de Mário Covas. Enfrentava Jânio Quadros, um candidato sem estrutura partidária, sem programa e que entrou na campanha como livre atirador. Fernando Henrique achou que ganharia fácil. Perdeu.

No ano seguinte, três meses após a eleição municipal, propôs, em entrevista, que o PMDB abandonasse o governo, dias antes da implementação do Plano Cruzado, que permitiu aos candidatos da Aliança Democrática vencer as eleições em todos os Estados. Ele, aliás, só foi eleito senador graças ao Cruzado.

Passados seis anos, lutou para que o PSDB fizesse parte do governo Fernando Collor. Ele seria o ministro das Relações Exteriores (e o PSDB receberia mais duas pastas). Graças à intransigência de Covas, o partido não aderiu. Meses depois, foi aprovado o impeachment de Collor.

Em 1993, contra a sua vontade, foi nomeado ministro da Fazenda por Itamar Franco. Não queria, de forma alguma, aceitar o cargo. Só concordou quando soube que a nomeação havia sido publicada no Diário Oficial (estava no exterior quando da designação). E chegou à Presidência justamente por esse fato - e por causa do Plano Real, claro.

Em 2005, no auge da crise do mensalão, capitaneou o movimento que impediu a abertura de processo de impeachment contra o então presidente Lula. Espalhou aos quatro ventos que Lula já era página virada na nossa História e que o PSDB deveria levá-lo, sangrando, às cordas, para vencê-lo facilmente no ano seguinte. Deu no que deu, como sabemos.

Agora resolveu defender a tese de que a oposição tenha um candidato presidencial, com uma antecedência de dois anos e meio do início efetivo do processo eleitoral. É caso único na nossa História. Nem sequer na República Velha alguém chegou a propor tal antecipação. É uma espécie de dedazo, como ocorria no México sob o domínio do PRI. Apontou o dedo e determinou que o candidato tem de ser Aécio Neves. Não apresentou nenhuma ideia, uma proposta de governo, nada. Disse, singelamente, que Aécio estaria mais de acordo com a tradição política brasileira. Convenhamos que é um argumento pobre. Ao menos deveria ter apresentado alguma proposta defendida por Aécio para poder justificar a escolha.

A ação intempestiva e equivocada de Fernando Henrique demonstra que o principal partido da oposição, o PSDB, está perdido, sem direção, não sabendo para onde ir. O partido está órfão de um ideário, de ao menos um conjunto de propostas sobre questões fundamentais do País. Projeto para o País? Bem, aí seria exigir demais. Em suma, o partido não é um partido, na acepção do termo.

Fernando Henrique falou da necessidade de alianças políticas. Está correto. Nenhum partido sobrevive sem elas. O PSDB é um bom exemplo. Está nacionalmente isolado. Por ser o maior partido oposicionista e não ter definido um rumo para a oposição, acabou estimulando um movimento de adesão ao governo. Para qualquer político fica sempre a pergunta: ser oposição para quê? Oposição precisa ter programa e perspectiva real de poder. Caso contrário, não passa de um ajuntamento de vozes proclamando críticas, como um agrupamento milenarista.

Sem apresentar nenhuma proposta ideológica, a "estratégia" apresentada por Fernando Henrique é de buscar alianças. Presume-se que seja ao estilo petista, tendo a máquina estatal como prêmio. Pois se não são apresentadas ideias, ainda que vagas, sobre o País, a aliança vai se dar com base em qual programa? E com quais partidos? Diz que pretende dividir a base parlamentar oficialista. Como? Quem pretende sair do governo? Não será mais uma das suas análises de conjuntura fadadas ao fracasso?

O medo de assumir uma postura oposicionista tem levado o partido à paralisia. É uma oposição medrosa, envergonhada. Como se a presidente Dilma Rousseff tivesse sido eleita com uma votação consagradora. E no primeiro turno. Ou porque a administração petista estivesse realizando um governo eficiente e moralizador. Nem uma coisa nem outra. As realizações administrativas são pífias e não passa uma semana sem uma acusação de corrupção nos altos escalões.

O silêncio, a incompetência política e a falta de combatividade estão levando à petrificação de um bloco que vai perpetuar-se no poder. É uma cruel associação do grande capital - apoiado pelo governo e dependente dele - com os setores miseráveis sustentados pelos programas assistencialistas. Ou seja, o grande capital se fortalece com o apoio financeiro do Estado, que o brinda com generosos empréstimos, concessões e obras públicas. É a privatização em larga escala dos recursos e bens públicos. Já na base da pirâmide a estratégia é manter milhões de famílias como dependentes de programas que eternizam a disparidade social. Deixam de ser miseráveis. Passam para a categoria da extrema pobreza, para gáudio de alguns pesquisadores. E tudo temperado pelo sufrágio universal sem política.

Em meio a este triste panorama, não temos o contradiscurso, que existe em qualquer democracia. Ao contrário, a omissão e a falta de rumo caracterizam o PSDB. Para romper este impasse é necessário discutir abertamente uma proposta para o País, não temer o debate, o questionamento interno, a polêmica, além de buscar alianças programáticas. É preciso saber o que pensam as principais lideranças. Numa democracia ninguém é líder por imposição superior. Tem de apresentar suas ideias.

MARCO ANTONIO VILLA, HISTORIADOR, É PROFESSOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS (UFSCAR)



Notícias do Tucanistão

Deu na Folha de S.Paulo, panfleto tucano:

"Uma a cada cinco pessoas assassinadas na cidade de São Paulo em 2011 foi morta por um policial militar, estivesse ele em serviço ou não.

A informação é de reportagem de André Caramante, Afonso Benites e Evandro Spinelli, publicada na Folha desta quarta-feira (disponível para assinantes do jornal e do UOL, empresa controlada pelo Grupo Folha, que edita a Folha).

Levantamento feito pela Folha, com base nos dados da Corregedoria da Polícia Militar, revela que, das 1.299 pessoas mortas na capital paulista nesse período do ano passado, 290 foram atingidas por PMs --22,3% do total.
As 290 mortes cometidas por PMs são casos de "resistência seguida de morte" (229) e homicídios dolosos fora do trabalho (61). Essa é a maior média de mortos por PMs desde 2005, proporcionalmente ao total de pessoas mortas na cidade."

Marx 2020


"Tudo o que sei é que eu não sou marxista".

Filósofo mais do que agitador, cientista mais do que ativista, amante da democracia. Eis quem realmente era o pai do Manifesto do Partido Comunista. Palavra de quem está arquivando a sua imensa obra ainda inédita: 114 volumes, o último dos quais será publicado em 2020. Em tempo, talvez, para entender em que mundo viveremos, como demonstra um trecho jamais lido do Capital, que parece ter sido escrito hoje.

A reportagem é de Andrea Tarquini, publicada no jornal La Repubblica, 08-01-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Agitador, revolucionário, profeta inflexível da luta de classes. Foi assim que ele permaneceu na memória do mundo. Mas não: ele foi acima de tudo teórico e cientista, politólogo e pensador crítico sempre curioso, muito atento até às ciências naturais e às novas tecnologias. Acreditava na democracia e na liberdade de expressão muito mais do que se pensa, considerava-as irrenunciáveis. E ele tinha previsto a seu modo a crise contemporânea do capitalismo atual, muito mais do que as ditaduras totalitárias real-socialistas transmitiram.

Ele surge do passado como um moderno new-labourista, um progressista alemão ou um liberal norte-americano, dos seus escritos de milhares de páginas amareladas, mas desempoeiradas cuidadosamente em um belo edifício neoclássico aqui de Berlim, no número 22/23 da Jaegerstrasse.

Aqui na esplêndida Mitte, a um passo da Gendarmenmarkt, a praça das cerimônias prussianas e do Kaiser, talvez a mais bela da capital. Estamos no quarto andar da Berlin-Brandenburgische Akademie der Wissenschaften, a Academia de Ciências que revê a sua obra e, um volume depois do outro, prepara a sua publicação completa: 114 tomos de hoje até 2020, e sabe-se lá como o mundo será então.

"Certamente, ele o tinha estudado e previsto muito melhor de como nos foi dito pelos poderes que o usaram post-mortem", explica o doutor Gerald Hubmann, responsável, ao lado do professor Manfred Neuhaus, do grande trabalho.

Mas, enfim, de quem estamos falando? De Karl Marx, justamente ele. Aqui, os seus escritos, livros, anotações, cartas são estudados, relidos de modo crítico e publicados passo a passo. E ele, "o velho barbudo" – como o chamaram, afetuosa e reverentemente, muitas gerações de militantes de esquerda –, juntamente com Friedrich Engels, volta a ser atual sob uma outra luz.

É um mergulho na história, o da Jaegerstrasse 22/23. Um mergulho sereno na ducha fria e inquietante da crise do mundo global. Os volumes, reeditados em versão crítica e científica, um depois do outro, se empilham nas salas dos acadêmicos. Mega – "grande" em grego antigo – é o nome do projeto das obras completas de Marx e Engels, revista de modo crítico. Mega, em alemão, é uma sigla: Marx-Engels GesamtAusgabe. Remexendo nas cartas consumidas pelo tempo, descobrem-se coisas que os contemporâneos de Marx queriam ignorar, e que o marxismo-leninismo oficial preferiu censurar.

As Teses sobre Feuerbach, explica Hubmann, não fizeram parte, no início, de A ideologia alemã. Foram inseridas apenas depois, e o todo, segundo Marx, era apenas uma coleção de apontamentos "destinados para os ratos". Apontamentos de agitação política entregues aos manuscritos seus da época, todos à pena com correções e rasuras, os desenhos de rostos muitas vezes femininos, talvez esboçados por Engels ao lado. Slogans políticos transformados em ortodoxia na URSS.

Em suma: a teoria segundo a qual a existência material determina a consciência, base do materialismo histórico, explica Hubmann, era uma ideia em que Marx não acreditava. "Olhe aqui", diz ele, mostrando um volume reeditado, "Marx disse: 'Tudo o que eu sei é que não sou um marxista'".

"Um livro depois do outro", explica Hubmann, "nós, curadores do Mega, descobrimos um outro Marx. Não um 'cachorro morto', não um ideólogo do passado, mas sim um politólogo e cientista atual. Um homem que continuou pesquisando com curiosidade até a velhice e soube ver e prever as raízes da crise de hoje. Estudou, nos seus últimos anos, a evolução do capitalismo, de capitalismo industrial a sistema cada vez mais baseado no crédito e nas finanças e, portanto, exposto às suas oscilações e às suas incertezas", a crises ingovernáveis em detrimento de todos.

A reviravolta, a sua fase depois do Capital, começou com o estudo da economia norte-americana: os grandes espaços, a exigência de construir às pressas ferrovias e outras infraestruturas, o crescente apetite por matérias-primas, o boom da agricultura, explicam os acadêmicos, impuseram a crescente dependência da economia real ao crédito: era necessário cada vez mais dinheiro.

Mega II/13: eis as análises do Marx idoso sobre os novos processos de circulação do capital, sobre o seu desenvolvimento turbinado como sistema cada vez mais financeiro. Parece ler páginas sobre a crise dos nossos dias, mas, ao contrário, são tão velhas quanto um século e meio.

Foi um acaso, um acidente da história que o projeto Mega tenha podido ver a luz do dia. Obras, correspondências e apontamentos de Marx e Engels estavam ao alcance das mãos, no arquivo do SPD [Partido Social-Democrata alemão]. Depois da Revolução Bolchevique, nasceu um volumoso trabalho comum de cientistas social-democratas alemães e do PCUS [Partido Comunista da União Soviética] para organizá-los.

Parte do material foi levado para Moscou, outra parte permaneceu na vibrante Berlim da frágil República de Weimar. Foram as raízes da obra completa, mas os dramas daqueles anos a secaram. A pesquisa daqueles cientistas e filósofos também caiu muito rapidamente sob os olhos desconfiados da NKVD, a polícia secreta de Stalin. O ditador, relata Hubmann, não gostou de descobrir certas páginas críticas, certas notas sobre a exigência da liberdade de expressão e do livre debate entre forças políticas e sociais. Menos ainda lhe agradou descobrir que Marx e Engels tinham escrito muito mais do que Lenin e não teorizavam um totalitarismo, muito menos os gulag.

Com a brutal reviravolta autoritária na URSS, os cientistas marxistas acabaram mal. Começando pelo seu líder, David Ryazanov, que foi executado por traição em 1938, pouco antes do pacto Hitler-Stalin. Outros acabaram vigiados e só a grande fama os salvou de um pelotão de fuzilamento. Foi o caso de György Lukács, o pai húngaro do marxismo crítico.

Mas se Moscou chorava, Berlim não sorria. Veio 1933, a democracia de Weimar foi derrubada por Hitler. Os arquivos do SPD se salvaram por acaso: os social-democratas, desafiando a Gestapo, os levaram a amigos acadêmicos holandeses. "Quem sabe por que, mas, anos mais tarde – narra Hubmann –, na Holanda ocupada, a Gestapo e a polícia colaboracionista jamais pensaram em vasculhar os porões da academia de Amsterdã, jamais descobriram o que de bom grado destruiriam".

Veio 1945, a derrota do Eixo e a Guerra Fria com a Alemanha dividida. A URSS e a República Democrática da Alemanha (RDA) retomaram o trabalho de edição completa depois da morte de Stalin, mas Brezhnev o impediu: muitos manuscritos críticos, muitas ideias perigosas de convite à dúvida.

O trabalho ficou congelado até o 1989 da queda do Muro de Berlim. "E, embora possa parecer estranho", observam os professores da Jaegerstrasse, "se trabalhamos livremente e com rigor científico no Mega, também devemos isso a Helmut Kohl, certamente insuspeito de simpatias marxistas. O chanceler da reunificação, que amava história, decidiu que, talvez ocultamente, a pesquisa sobre essas toneladas de manuscritos que a RDA havia trancado no porão deveria ser retomada na Alemanha unificada".

Passaram-se mais de 20 anos desde aquela enésima reviravolta em que os manuscritos amarelados dos dois barbudos conseguiram sobreviver. Agora, o trabalho continua, dividido entre Berlim, Amsterdã e Moscou. Com o crescente interesse dos preparadíssimos cientistas oficiais chineses, que talvez procuram neles por novas ideias para a futura primeira potência mundial. Eles também descobrem um outro Marx. O homem que, perseguido por quase toda a Europa, ganhava a vida como correspondente do New York Daily Tribune.

Revejamos essas páginas: ele narrava como um grande enviado os abalos políticos e sociais ou as crises econômicas da Europa de então, até mesmo os primeiros movimentos operários na Itália ou na Espanha. Não havia as comunicações modernas: Marx e Engels enviavam os artigos para Nova York por navio, tinham que escrevê-los pensando para que não envelhecessem. Jenny Marx, a amada esposa, mantinha a contabilidade de cada expedição. Ela também começou a conservar os mais curiosos e incríveis escritos do marido ancião. Karl tinha renunciado à política, anotava a sua confiança no livre debate e no confronto de ideias e de forças políticas. E começou a estudar as ciências: eis os apontamentos e rabiscos perfeitos sobre a geologia, sobre a física, sobre os primeiros passos da ciência nuclear.

E eis, por fim mas não por último, a descoberta mais fascinante, talvez. Marx e Engels, na Europa do capitalismo sem Internet nem jatinhos, criaram uma rede de troca de correspondência internacional. Com líderes operários, com políticos, com cientistas, pessoas de todas as correntes de pensamento ou de tendência: a seu modo, dizem satisfeitos os acadêmicos da Jaegerstrasse, essa foi a primeira rede social. Funcionou durante anos.

Seja bem-vindo de volta, querido velho Marx, e desculpe-nos: muitos extremismos opostos do século XX tinham te transmitido mal. Vemo-nos em 2020. Talvez nos serviremos de ti quando sabe-se lá que rosto o capitalismo terá.


Fonte: IHU


Nascituro: um problema de saúde sem pai nem mãe!

por Conceição Lemes

Na última quinta-feira, 26, a presidenta Dilma Rousseff, ao ser questionada sobre a Medida Provisória 557 que instituiu o Sistema Nacional de Cadastro da Gestante, afirmou: “ Erramos, vamos retirar a MP”.

Foi durante uma reunião com os movimentos sociais no Fórum Mundial Social, em Porto Alegre. A notícia nos chegou, primeiro, via farmacêutica Clair Castilhos, secretaria-executiva da Rede Feminista de Saúde, de Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos que, em e-mail a várias entidades e pessoas, comemorou, mas com cautela: “Vamos aguardar a confirmação”.

Logo depois, Cintia Barenho, do Centro de Estudos Ambientais de Rio/Pelotas, que estava na reunião, confirmou pelo twitter:


Dilma foi aplaudida de pé pelas pessoas presentes, especialmente pelo movimento feminista, quando admitiu o equívoco em relação à MP 557 e informou a decisão de retirá-la da pauta do Executivo, relata a Articulação de Mulheres Brasileiras.

Nessa sexta-feira, a presidenta Dilma fez apenas uma correção na Medida Provisória 557. Retirou do texto o termo nascituro.

A MP 557 , entre outros equívocos apontados por vários movimentos sociais e entidades que a repudiaram, misturou Estado e religião, mais precisamente com algumas visões religiosas. O que num Estado laico, como o brasileiro, é inconcebível.

– Misturou Estado e religião?! Como?! Onde?!… – muitos já devem ter aparteado.

Ao incluir o nascituro como sujeito autônomo.

– Mas o que é nascituro?

Essa é a pergunta que mais me fazem nos últimos dias, pois muita gente ainda não entendeu o que realmente significa o termo.

Até 26 de dezembro de 2011, quando a presidenta Dilma baixou a MP 557, nascituro, para mim, era apenas uma palavra inusual, pouco sonora.

Era, porque isso mudou.

Antes de explicar por que, gostaria de voltar à última eleição presidencial.

14 de setembro de 2010, terça-feira, Nova Iguaçu, Baixada Fluminense, RJ. A duas semanas do primeiro turno, Monica Serra, acompanhada de Índio da Costa (na época, DEM, hoje PSD), vice do seu marido, José Serra (PSDB), dá a senha para um dos lances mais sórdidos da campanha passada, além de ter protagonizado o mais hipócrita de todos.

A um eleitor evangélico, que citava Jesus Cristo como o “único homem que prestou no mundo” e declarou voto em Dilma, Monica disse que a petista era a favor do aborto. Ao vendedor ambulante Edgar da Silva, de 73 anos, assegurou: “Ela [Dilma] é a favor de matar as criancinhas”.

Em entrevista de 2009, Dilma afirmara ser favorável à descriminalização do aborto, procedimento médico permitido no Brasil em casos de estupro e risco à vida da mãe, desde o Código Penal de 1940.

Em maio de 2010, a ainda pré-candidata do PT à Presidência da República declarou: “Um governo não tem de ser a favor ou contra o aborto. Tem que ser a favor de uma política pública. Aborto não é questão de foro íntimo meu, seu, da Igreja, de quem quer que seja; é uma questão de saúde pública”.

Aí, numa manobra de má-fé dos seus adversários, o aborto virou o foco principal da campanha de 2010, e a religião passou a ser, inescrupulosamente, manipulada.

Para manter os dedos, Dilma teve de dar os anéis. Após se reunir com segmentos religiosos, divulgou, em 15 de outubro de 2010, a chamada Mensagem de Dilma. Tinha seis itens, dois deles, o segundo e o terceiro, referiam-se explicitamente ao aborto:


26 de dezembro de 2011, segunda-feira, Brasília, DF. A presidenta Dilma Rousseff baixa a MP 557. Assinam-na também os ministros da Saúde (Alexandre Padilha), Guido Mantega (Fazenda) e Miriam Belchior (Planejamento).

Uma palavra me soou estranha naquele contexto: nascituro. Estava lá bem no final da MP, no artigo 19 J, como quem não quer nada. Embora eu seja repórter especializada em saúde há 30 anos, eu ainda não a tinha visto em documentos do Ministério da Saúde sobre saúde da mulher, saúde materna e mortalidade materna.


Porém, feministas históricas, como Fátima Oliveira, Beatriz Galli, Maria José Rosado e Sônia Correa, mataram a charada, de primeira, e alertaram: o nascituro estava ali de contrabando.


“A garantia de direitos ao nascituro vai flagrantemente contra a Constituição de 1988, é inconstitucional. A MP 557, ao igualar os direitos da mulher gestante aos do nascituro reduz ou dilui os direitos da mãe, como o direito à liberdade, já que ela terá a sua gravidez registrada e supervisionada ou vigiada para cumprir os dispositivos da Medida Provisória”.

“Pela MP 557, a rigor a mulher terá a ‘obrigação’ legalmente imposta de ter todos os filhos gerados já que estaria sendo monitorada pelo Estado para tal finalidade. Viola-se, assim, o direito à igualdade previsto na Constituição Federal, pois somente as mulheres engravidam e podem gerar filhos”.


“A inserção do nascituro, admitindo direitos de cidadania a uma expectativa de cidadão, é uma anomalia e inconstitucionalidade. E a cidadã real e existente torna-se refém do serviço de saúde e/ou da polícia”.


“Ao introduzir a figura do nascituro, que não existe fora do corpo da gestante, como portador de direitos, a MP 557/2011 abre precedente, principalmente, para influência de algumas correntes religiosas e de setores conservadores”.

Desde os primeiros dias após a edição dessa Medida Provisória, a médica e feminista Fátima Oliveira bate nesta tecla: “O objetivo da MP 557 é o nascituro, foi feita para reconhecê-lo”.

Seria mesmo essa a intenção?

Ao assinar a MP, a presidenta Dilma saberia de todas as implicações do termo nascituro?

O ministro da Saúde também?

Padilha teria alertado a presidenta sobre a conexão nascituro-Igreja Católica- Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)?

Ou o nascituro seria “obra” de algum assessor esperto na calada da noite e o ministro a desconheceria até a publicação da MP?


Essas e outras dúvidas ferviam na minha cabeça quando da entrevista que o doutor Fausto Pereira dos Santos, assessor de ministro Padilha, concedeu ao Viomundo, publicada em 10 de janeiro. Tanto que abordei a questão do nascituro em dois momentos.

Um deles foi no meio da entrevista:


O segundo, no final da entrevista:


A partir dessa entrevista, não tive dúvidas: a MP foi gestada no Ministério da Saúde e o nascituro é seu “filho”, ainda que possa ter “padrinhos” e/ou “madrinhas” no Palácio do Planalto.

A assessoria de imprensa do Ministério da Saúde acompanhou toda a entrevista que esta repórter fez com o assessor do ministro Padilha. Depois, monitorou todos os e-mails que trocamos.



– Mas o que tem a ver a campanha presidencial de 2010 com MP 557? – alguns devem estar cobrando. – E com o nascituro?

Calma. Antes, gostaria de compartilhar com vocês outras dúvidas que me ocorreram imediatamente após a entrevista com o doutor Fausto e a reação do ministro à pergunta que fiz sobre a sua religião, a pedido de vários leitores do Viomundo em comentários nas matérias sobre a MP 557.

Se a intenção era dizer uma coisa e a MP acabou dizendo outra, por que o Ministério da Saúde não poderia corrigir o erro e editar uma nova Medida Provisória, retirando o nascituro?

Repito. Na entrevista como assessor do ministro Padilha publicada em 10 de janeiro pelo Viomundo, eu perguntei se em função da polêmica gerada pela inclusão do nascituro, o Ministério da Saúde ia manter ou cogitava tirá-lo da MP 557. Ele respondeu: “A medida provisória já está tramitando no Congresso Nacional, local onde pode haver essa discussão”.

Por que o assessor do Ministério da Saúde disse ao Viomundo que a ministra Iriny Lopes, da Secretaria de Políticas Especiais para Mulheres, tinha visto a minuta da MP, quando, na verdade, ela nos assegurou que não participou de nada?

Por que até hoje o Ministério da Saúde não desmentiu a ministra Iriny Lopes?

Por que nenhuma entidade dos movimentos de mulheres foi convidada para discutir a elaboração da MP, embora tenha circulado nas redes sociais a informação enganosa de que a Rede Feminista de Saúde teria participado das negociações e dado o seu aval?

Seria por que as entidades feministas e a ministra Iriny Lopes descobririam no ato o contrabando embutido e chiariam?

Por que o ministro Padilha não levou a MP para ser debatida na reunião do Conselho Nacional de Saúde (CNS), de 14 e 15 de dezembro, já que ele é seu presidente, lá estão representados todos os segmentos da sociedade e o assunto é tão importante?

Curiosidade: o item 2 da pauta do dia 14 do CNS era o “Balanço do mês na saúde: Saúde Integral da Mulher”, apresentado pela doutora Maria Esther de Albuquerque Vilela, coordenadora Área Técnica de Saúde da Mulher do Ministério da Saúde.

– Mas, afinal, o que tem a ver a campanha presidencial de 2010 com a MP 557? – vários devem ter voltado à carga. — E com o nascituro?

Ontem, 27 de janeiro, fez um mês que a MP 557 foi publicada. Ironicamente, ontem também saiu uma correção da MP, retirando o nascituro.

– Besteira…Questão de semântica — alguns leitores devem ter contestado, enquanto outros menosprezam-no – Apenas um termo mais forte…

Não e não. O uso do termo não foi um cochilo na redação, mas algo intencional, estrategicamente bem pensado. E a intenção da MP 557 era o nascituro.

Até porque a MP 557 “não resolve o problema da mortalidade materna; tudo o que ela cria ou normatiza já existe no Ministério da Saúde”, observa o kit anti-MP 557, elaborado por Gilda Cabral, do Cfemea, e entregue ao ministro, na reunião dessa quarta-feira, 25 de janeiro, do Conselho Nacional de Saúde, em Brasília. “Ela é totalmente desnecessária”.

Exceto por um detalhe: o nascituro.

Diante desse quadro, uma das possibilidades para a inserção do nascituro como sujeito autônomo na MP talvez tenha a ver com acordos políticos com os setores religiosos mais conservadores durante a campanha presidencial de 2010.

Alguém teve a “brilhante” ideia de colocar no papel, agora já com a assinatura da presidenta Dilma, o que a então candidata havia prometido na eleição: não descriminalizar o aborto no Brasil. E já que estava com a mão na massa, aproveitou para ir um pouco mais longe, abrindo caminho para impedir o aborto nos casos de anencefalia, que está para ser julgado no Supremo Tribunal Federal (STF), e talvez, mais no futuro, até a proibição de todo tipo de aborto no Brasil.

– Como? Qual a mágica?

Enfiando, de contrabando, o nascituro em documento oficial da Presidência da República. Sem mexer diretamente na legislação referente ao aborto, sacramentaria o nascituro, o que serviria de combustível para a sua proibição em casos de anencefalia e, quem sabe mais adiante, ensejar campanha para sua proibição, mesmo nos casos em que a lei brasileira já autoriza desde 1940.

Nascituro a rigor seria o que está prestes a nascer, logo um feto. Todavia os chamados grupos “pro-life”, consideram nascituro embriões e fetos. Nos Estados Unidos, o Dia do Nascituro foi instituído, em 2004, pelo então presidente George W. Bush. Lá e em alguns outros países, como Argentina, Chile, Peru, Costa Rica, Guatemala e Nicarágua, é comemorado em 25 de março, Dia da Anunciação de Maria.


“foi escolhido porque nele é celebrado (sic) a Anunciação: a notícia, levada pelo Arcanjo Gabriel a Maria, de que Deus a havia escolhido para ser mãe do Redentor. O que leva consigo a proteção do nascituro desde o momento da concepção”.

Em 1999, o então deputado federal Severino Cavalcanti (PP/PE) apresentou o projeto de lei nº 947/1999, instituindo o “Dia do Nascituro, a ser festejado no dia 25 de março de cada ano”. O projeto, atualmente tramitando na Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF), já recebeu um parecer favorável, mas ainda não foi oficializado.

Porém, a 43ª Assembleia Geral da CNBB, realizada em Itaici, de 9 a 17 de agosto de 2005, definiu o dia 8 de outubro como o dia do Nascituro.


“porque muitos nem terão direito a conviver com sua mãe, por pouco que seja, vítimas que serão de experimentos dito “científicos” de clonagem, ou serão “congelados”, alguns até destruídos, enquanto ficam à espera de que sua mãe aceite recebe-los (sic) em sua barriga”.

No artigo “Pena de Morte para o Nascituro”, publicado originalmente em O Estado de S. Paulo, em 1997 e republicado em vários sites católicos, o jurista Ives Gandra da Silva Martins, conhecido por suas posições ultraconservadoras, afirma:

“Todos os seres humanos são seres humanos desde a concepção. Nesse momento, todos os seus componentes biológicos e psicológicos estão formados, tendo os defensores do aborto, desde a concepção, seu perfil atual delineado”.

“Dessa forma, o denominado aborto legal – que desde 1988 não é mais legal – nada mais é do que uma pena de morte imposta ao ser humano quando ainda vive no ventre materno”.

– Afinal, então o que é o nascituro?

É um feto, mas os chamados “pró-vida” consideram como nascituro desde o instante em que o espermatozóide fecunda o óvulo. Ou seja, quem defende os direitos do nascituro é contra, por exemplo, as pesquisas com células tronco-embrionárias, que representam a esperança para a cura de várias doenças ainda incuráveis, como mal de Parkinson, diabetes, doenças neuromusculares e seção da medula espinhal por acidentes e armas de fogo

– Mas o Supremo Tribunal Federal (STF) já aprovou as pesquisas com células tronco-embrionárias no Brasil!!!

Aprovou, sim, numa votação histórica em maio de 2008, mas contra a vontade dos setores fundamentalistas da Igreja Católica. Aliás, quem defendeu a posição da igreja no STF foi justamente Ives Gandra Martins, que é da Associação Nacional Pró-Vida e Pró-Família, que, por sua vez, integra o Human Life Internacional — Pro-Life Missionaires to the World.

É só fazer uma pesquisa no Google, irá descobrir isso.

“O nascituro aparece normalmente em sites e textos relacionados à Igreja Católica”, alertou-me NaMaria, do blog NaMariaNews. “Veja como em 2011 dom Luiz Bergonzini e a CNBB comemoraram o dia do Nascituro!



Dom Luiz Bergonzini foi bispo de Guarulhos, em São Paulo, até semana passada. Bergonzini é aquele que, durante a campanha presidencial de 2010, produziu textos contra Dilma e o PT por conta do aborto.

Bergonzini, assim como a CNBB, defende o projeto de lei 478/07, que cria o Estatuto do Nascituro, já aprovado na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados.

O estatuto defende o nascituro como portador de direitos desde a “concepção”, ou seja, desde que o espermatozóide fecunda o óvulo. Essa definição, além de dificultar futura legalização do aborto por decisão da mulher, acaba a possibilidade de ele ser feito legalmente, inclusive na rede pública de saúde, nos casos de estupro ou quando a gravidez coloca em risco a vida da mãe.

Em bom português: não importa que a gestante morra ou que seja estuprada para que a criança nasça. Mais valem as novas “ovelhinhas do rebanho”, que se lixem as mulheres, sua saúde, sua vida.

– Ah, mas quem estava falando em mexer na legislação atual sobre o aborto? O projeto do Ministério da Saúde não propunha isso!

Ok. Não propunha, mesmo. Mas o fato de ele constar num documento assinado pela presidenta da República e pelo ministro da Saúde seria sinal de reconhecimento da autonomia e personalidade civil do nascituro. E já que eles a legitimavam por que, num primeiro momento, não aprovar a MP no Congresso com o nascituro? Depois, num segundo, lutar para aprovação do Estatuto do Nascituro e, daí, proibir totalmente o aborto no Brasil? Ou, pelo menos, impedir que o aborto seja feito no Brasil nos casos de anencefalia?

– Mas a MP do Ministério da Saúde não propunha nada disso! – alguns vão refutar – Isso é exercício de futurologia!

Realmente, a MP não propunha isso. Só que, enquanto estamos indo com a farinha, a Igreja já voltou com o mingau pronto — e frio. Pensa adiante, a longo prazo.

Está no site da CNBB, na matéria Semana da Vida e dia do Nascituro, postada em 4 de outubro de 2011, às 10h39:

“A Semana Nacional da Vida, celebrada de 1 a 7 de outubro oferece um tema em sintonia com a Campanha da Fraternidade deste ano: “vida, ecologia humana e meio ambiente”. A Comissão Episcopal para a Vida e a Família e a equipe da Pastoral Familiar da CNBB prepararam um subsídio distribuído nas comunidades em todo o Brasil fornecendo um memorial das semanas anteriores, além de sugerir encontros de reflexão sobre o tema e uma celebração que pode ser usada na preparação para o dia do nascituro, o domingo 8 de outubro”.

“Padre Rafael Fornasier, assessor nacional da Comissão, considera que o tema da Semana, de algum modo, prepara os cristãos para o iminente debate que deverá surgir no país com a retomada da discussão e votação que serão realizadas no Supremo Tribunal Federal sobre o aborto de crianças anencéfalas. “Há uma expectativa a respeito da análise do STF que vai fazer e que pode ser uma abertura para a legalização do aborto no Brasil”, adverte Padre Rafael. Segundo ele, poderá voltar o costumeiro embate entre a o conflito de direitos. “Não se nega o direito da mulher, mas que não seja em detrimento do direito da vida nascente”, lembra.

Curiosamente, nessa mesma época em 2011, a MP 557 estava sendo gestada no Ministério da Saúde e em outras instâncias do governo federal.

Foi próprio assessor do ministro Padilha que revelou isso na entrevista ao Viomundo: “Esse processo da Medida Provisória está tramitando entre o Ministério da Saúde, a Casa Civil e outros ministérios envolvidos desde setembro de 2011″.

Coincidência ou não, soa estranho o fato de a MP ter começado a tramitar no governo nas proximidades do Dia do Nascituro.

Soa mais estranho ainda porque:

1) nascituro é um termo usado principalmente pelos católicos mais conservadores;

2) do ponto de vista médico, técnico e de prevenção à mortalidade materna não há NADA signifique a inclusão do nascituro como sujeito autônomo;

3) até o momento o Ministério da Saúde não deu nenhuma explicação razoável para ter enfiado o nascituro na MP;

4) as reações em manada, raivosas, destemperadas, aos textos e reportagens publicados pelo Viomundo, denunciando os absurdos da 557. Foram muito bem orquestradas. Um revival da campanha presidencial de 2010, bem ao estilo usado pelos asseclas de José Serra, dom Luiz Bergonzini & cia.

Em entrevista ao Viomundo, Fátima Oliveira disse com todas as letras:

“Nós não estamos falando em legalização do aborto. A Dilma já disse que não vai mexer com isso. Então não vamos perder o nosso tempo. Mas nós queremos o que conquistamos nessa área. A aplicação da norma técnica de atenção humanizada aos casos de aborto previstos em lei, o que não vem acontecendo”.

Como os adversários de Dilma na eleição, os religiosos fundamentalistas passaram a dizer que as feministas estavam contra a MP 557 porque queriam legalizar o aborto. Não adiantava dizer que elas não haviam dito isso em relação à MP. Assim como, em 2010, eles jogaram espertamente o aborto na mesa para tentar esconder a real intenção.

Só que, bateram tão forte e recorreram a tantas mentiras e tantos sofismas, que acabaram flagrados com o nascituro nas mãos. Não dá mais para esconder: a 557 era a MP do Nascituro, sim, até porque as demais medidas embutidas na MP já estão ou podem ser resolvidas perfeitamente por portarias do Ministério da Saúde.

A propósito 1: na abertura da entrevista que fiz com a doutora Fátima Oliveira, publicada peloViomundo em 5 de janeiro, eu disse:

Elegemos Dilma como presidenta de uma República laica, mas parece que quem dá as cartas na saúde das mulheres brasileiras é o ideário fundamentalista do tucano José Serra nas eleições de 2010, assessorado pelo bispo de Guarulhos, dom Luiz Gonzaga Bergonzini.

Que bom que a presidenta reconheceu que foi um erro a inclusão do nascituro na MP.

A propósito 2: no dia seguinte à entrevista que fiz com Fátima Oliveira, dom Luiz Bergonzini, postou na aba “aborto” do seu blog: Medida Provisória n. 557 cria sistema de cadastro e prevenção de mortes das gestantes.

Sem mencionar o nascituro, que já havia saudado em outro post (AQUI), Bergonzini (grifos em negrito são dele mesmo) diz:

“Em nosso blog, na aba Aborto, provamos que as mortes maternas são decorrentes do precário atendimento médico às gestantes e que os números de abortos apresentados pelos abortistas são inverídicos”.

“Números inverídicos de abortos são utilizados pelos abortistas. Os abortistas utilizam os números dos abortos espontâneos para dizer que as mulheres querem praticar aborto. Os abortos espontâneos atingem até 40% das gestações”.

“Os abortistas são nazistas, stalinistas, preconceituosos e discriminadores, pois querem higienizar a raça humana do Brasil, matando as crianças das mulheres pobres ou negras”.

“Como dissemos em outro post, o aborto não é uma questão discutível, por se tratar de uma vida humana que deve ser preservada e do direito de nascer de cada ser humano gerado, o primeiro de todos os direitos”.

“Esperamos que, de agora em diante, números verdadeiros sejam registrados e que o objetivo de, sem nenhuma discriminação, garantir às mulheres brasileiras o direito à maternidade e ao atendimento médico qualificado seja atingido, para não mais acontecerem mortes evitáveis”.

A propósito 3: Dom Bergonzini não é voz isolada. Seu pensamento representa os setores religiosos mais conservadores, inclusive a CNBB.

A propósito 4: O nascituro, portanto, não caiu do céu. Quem incluiu o nascituro na MP sabe bem por que o fez.

A propósito 5: Na quarta-feira, 25 de janeiro, aconteceu em Brasília a reunião do Conselho Nacional de Saúde. Jurema Werneck, que é vice-presidente do CNS e integrante da Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras e estava presente, postou no twitter:


Mesmo o governo federal tendo retirado o nascituro da nova versão da MP 557, eu acrescento outras perguntas:

*O nascituro foi colocado por alguém do próprio Ministério da Saúde ou do Palácio do Planalto?

* Se foi no Ministério da Saúde, como o ministro leva um documento para a presidenta assinar sem ler e, ainda por cima, com uma inconstitucionalidade?

*Se foi alguém no Palácio do Planalto, por que Padilha não alertou Dilma para o fato e os riscos envolvidos, inclusive de trazer de volta o debate que tanto mal causou à campanha de 2010?

A exemplo da malfadada parceria com a rede McDonald’s, o nascituro se transformou no outro “filho feio” sem pai nem mãe do Ministério da Saúde.

De qualquer forma, a quem quer que tenha inserido o nascituro, eu pergunto: em nome da religião, terá valido a pena usar uma das tragédias de saúde pública brasileira, que é a mortalidade materna? Compensou ter induzido a presidenta a um erro grosseiro, colocando-a numa situação desconfortável?

Nenhum ministério pode se prestar ao papel de misturar Estado com religião. Muito menos, o Ministério da Saúde. É um equívoco crasso.

A propósito 6: A bem da verdade, o nascituro não é o único absurdo da MP 557. Movimentos sociais e entidades de peso da sociedade civil já se posicionam contra a MP e pediram a sua retirada.

A lista é imensa. Marcha Mundial de Mulheres, Articulação de Mulheres Brasileiras, Rede Feminista de Saúde, Central Única dos Trabalhadores (CUT-Nacional), Cebes (Centro Brasileiro de Estudos de Saúde), Abrasco (Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva), entre muitos.

Por isso, seria excelente se a presidenta se dispusesse a dialogar com essas entidades e movimentos. Eles podem – e muito! – contribuir com o seu governo no tema morte materna. Por que ignorá-los como fez o Ministério da Saúde na construção da MP 557?

A propósito 7: Na reunião do Conselho Nacional de Saúde (CNS) da última quarta-feira, por pouco não foi colocado em votação o pedido para o governo retirar a MP. Sob pressão, o ministro Padilha fez um acordo com o CNS para criação de um grupo técnico que teria 15 dias para propor sugestões à MP.

Só que, no dia seguinte, atropelando o combinado com o próprio CNS, o ministro reeditou a MP, conforme a sua visão de que o maior problema era a palavra nascituro. Essa alteração não corresponde ao teor completo das reivindicações. O acordo com o CNS foi foi rompido? O que está valendo agora?

Que a MP 557, a MP do Nascituro, sirva de lição a todos nós.


domingo, 29 de janeiro de 2012

Penso, logo desligo


Autor desconhecido

Brasil: inimigo meu


por Túlio Muniz

Em Agosto de 2011, o Observatório da Imprensa publicou artigo de minha autoria, Por novos discursos midiáticos, no qual abordei o conceito de “fascismo social”, de Boaventura Santos, e adiantei o que chamo de Dispositivo Pós-Colonial, ou DPC.

Relembrando: o “fascismo social” é “um tipo de regime no qual predomina a lógica dos mercados financeiros em detrimento de grandes setores das populações, gradativamente distanciados e excluídos do campo de direitos sociais adquiridos nas últimas décadas. O risco, alerta Santos, é o da ingovernabilidade”.

Presente no Forum Social de Porto Alegre quando da expulsão dos moradores do Pinheirinho, Santos, ainda que não referisse diretamente ao seu próprio conceito, demonstrou como o “fascismo social” é presente na sociedade brasileira, e reafirmou a necessidade de se contrapor a ações como aquela, que, com o aval do Estado, beneficiam setores dominantes e opressores em detrimento do bem público e social (ver aqui).

O caso do Pinheirinho é grave e preocupante, e alinha-se a outros acontecimentos recentes de violência estatal. Entre outros, estão a carga da polícia militar contra estudantes em São Paulo (USP) e contra professores cearenses, ambos em 2011. Vale lembrar que, já neste ano, a polícia militar foi autorizada pelos governos do Espirítio Santo, do Piauí e de Pernambuco a carregar contra estudantes, em protestos contra reajustes do transporte coletivo.

Aqui há perigo. SP está nas mãos dos debilitados tucanos, do PSDB que há quase duas décadas se aliou à direita financista, mas CE, PI, PE e ES são estados governador pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), o que demonstra que as cessões ao “fascismo social” não são exclusivos da direita, extravasaram também para a centro-esquerda, e às vezes com o silêncio conivente de partidos de esquerda.

Nos meio de comunicação convencionais, as abordagens críticas ao “fascimo social”, permanecem restritas aos espaços já consolidados (revista Carta Capital, Rede Record), com raras e bravas exceções, como a do jornalista Ricardo Boechat em seus comentários na Rádio Bandeirantes.

E eis que em meio ao caos ressurge com força o que outrora chamei de DPC, discursos e estratégias que os governos exercem sobre suas próprias populações, “impondo normas que visam tanto a justificar ocupações e dominação de territórios estrangeiros, quanto à imposição de determinações internas. Tais normas são geradas por governantes que necessitam coagir as populações nacionais e são sustentadas e difundidas pela mídia”.

A Rede Globo (não por acaso) permanece sendo o campo privilegiado de propagação do DPC. Se na TV aberta se esboça um certo pudor e contenção, estes se desnudam nos canais fechados da Globo, o que ficou patente em entrevistas recentes conduzidas por Monica Waldvogel.

Para além do bem e do mal, o DPC resulta no que se pretende, ou seja, coagir populações com discurso institucional legalista e higienista, conforme diz a Folha de S.Paulo de domingo, 29 de Janeiro: “Polícia na cracolândia é aprovada por 82% em SP”.

O que fazer nesse campo confuso, onde tanto o “fascismo social” quanto o DPC são gerados à esquerda e à direita? Talvez, estar atentos para o que muitos vem chamando de período pós-institucionais, a eclosão de movimentos não necessariamente estruturados ou vinculados à organizações governamentais e não-governamentais (nesse sentido sugiro leitura de análise de [Emir] Sader, aqui).

Entretanto, permanece relevante o papel de pensadores que se inserem na mídia para tratar de casos que passam ao largo da “neutralidade” jornalística, e exemplo disso é o artigo “Razão, desrazão”, do sociólogo e filósofo Daniel Lins no jornal O POVO de 29 de Janeiro, acerca da violência estatal no Pinheirinho: “A exclusão da loucura emerge no domínio das instituições mediadas pelo enclausuramento psiquiátrico ou social. Exilado em sua diferença intratável, o destino do louco ou do pobre é o confinamento moral, social”.

No mesmo nível de importância no combate ao DPC, estão os sites e blogues no estilo do Observatório, e tantos outros (viomundo, conversaafiada, escrevinhador, luiznassif, cartamaior, etc). Estes, mais do que a mídia convencional, primam pela proximidade entre jornalismo e pensamento. Portanto, parece urgente e preciso, cada vez mais, reforçar e manter a aliança entre opinião e reflexão, esta arma poderosa que causa horror aos jornalões, às TVs e ao poder institucionalizado.

Pinheirinho, polícia contra estudantes e professores, magistrados nababos, prédios desabando, mídia sem regulação. O Brasil, definitivamente, não precisa de inimigos externos.

*jornalista, historiador e doutor em Sociologia pelo Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra.

PS do Viomundo: Não há combate possível ao fascismo social sem democratização da mídia; mídia concentrada, ascensão social despolitizada — calcada no consumismo — e governo por pesquisas de opinião são ingredientes essenciais para fomentar o “discurso da ordem”, que existe para bloquear a expansão dos direitos sociais.