Um ministro bairrista no repasse de verbas contra enchente. Dilma disposta a enquadrá-lo com uma interventora. PT endossando denúncia de ONG de oposição e condenando um histórico aliado. Nas cordas, um PSB presidido por político com ambições em 2014 e à frente do estado beneficiado pelo bairrismo. Pronto, eis a polêmica. Mas os fatos parecem não sustentá-la.
André Barrocal, na Carta Maior
BRASÍLIA – Mais um ano começa com tragédias provocadas pelas chuvas que marcam esta época. O principal palco dos estragos até agora é Minas Gerais, onde pessoas morreram e uma centena de municípios já decretou situação de emergência. Os governos federal e estadual correm para socorrer vítimas, acolher desabrigados, liberar dinheiro, planejar a recuperação do destruído.
Ao mesmo tempo em que causa problemas concretos no mundo real, as chuvas também produziram consequências não muito longe de Minas, mas num mundo mais virtual, a política. Nascido na capital brasileira, o “aguaceiro” espraiou-se pelo país por meio de TVs, rádios, jornais, blogs da internet na forma de uma polêmica que talvez não mereça o adjetivo.
O motivo foi a suposta preferência explícita do ministro responsável pelo gasto de recursos federais destinados a prevenir enchentes por aplicá-los em seu estado de origem. Por trás da predileção de Fernando Bezerra por Pernambuco, estaria um interesse político de quem estaria de olho em uma candidatura a prefeito de Recife em outubro.
A tese de gestão eleitoreira de Bezerra foi sustentada com base na seguinte informação: de R$ 29 milhões em dinheiro liberado pelo ministério da Integração Nacional para obras contra enchentes em 2011, R$ 25 milhões foram para Pernambuco.
A informação foi levantada primeiramente por uma ONG chamada Contas Abertas, especializada na vigilância do gasto público. A entidade é de um deputado federal, Augusto Carvalho (DF), que pertence a um partido adversário do governo Dilma Rousseff, o PPS. A informação foi repassada pela ONG para um grande jornal, que a publicou na última terça-feira (3).
No mesmo dia, uma das ministras mais próximas da presidenta, Gleisi Hoffmann, da Casa Civil, abreviou as férias e voltou ao batente, por ordem da chefa, que só retomaria o trabalho nesta sexta (6). A entrada de Gleisi em cena foi vista pelo mundo político como uma intervenção presidencial na pasta do “politiqueiro” ministro Fernando Bezerra, que seria “enquadrado” a partir dali.
No dia seguinte, o secretário de Comunicação do PT, deputado federal André Vargas (PR), daria uma declaração a um jornal do estado dele, chamando de “equívoco” o “privilégio” dado por Bezerra, que é do PSB, ao próprio estado na liberação de recursos. E garantindo que “a presidente Dilma não concorda com esse tipo de gestão.”
Um ministro sem atitude republicana, como se viu em números. Uma presidenta irritada e disposta a enquadrar o auxiliar, por meio de uma interventora. O partido dela fazendo coro à denúncia de uma ONG de oposição e condenando em público um aliado histórico do PT, o PSB. Aliado que é presidido por um político em ascensão, Eduardo Campos, que vê as eleições presidenciais de 2014 com certas ambições e que é, justamente, governador de Pernbambuco. Pronto, estava criada a polêmica.
Mas, será que haveria mesmo motivo para uma? Na última quarta-feira (4), o ministro acusado de bairrismo convocou a imprensa para dar explicações. E, pelos dados que apresentou na entrevista, talvez mereça crítica mais por dificuldade de gastar todo o dinheiro que tinha à disposição, do que por privilegiar o próprio estado.
Em 2011, a Integração tinha R$ 366 milhões para investir em prevenção de enchentes. Empenhou, primeiro ato de um gasto público, 70% – mais de R$ 100 milhões não foram usados. E pagou de fato só R$ 29 milhões.
Destes pagamentos realizados, 90% foram mesmo para Pernambuco. Mas, disse o ministro, porque o estado tinha sido quem mais pedira verba federal depois que, em 2010, passou por uma das maiores tragédias causadas por chuvas na história brasileira, com mais de 18 mil famílias atingidas.
Aquela tragédia levara o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, a fazer um acordo com Dilma Rousseff para construir diversas barragens no estado, ao custo de R$ 600 milhões, de forma rateada com o governo federal. Era um dos estados com projetos em estágio mais avançado de elaboração e em mais condições de efetivamente receber dinheiro federal.
Segundo Fernando Bezerra, o que também mostra que não houve bairrismo no ministério, é a análise do resto do orçamento. No ano passado, as ações posteriores a enchentes – socorro a pessoas com alimentos e remédios ou reconstrução de estradas, por exemplo – , tiveram empenho de R$ 910 milhões por parte do ministério. Só a metade foi paga.
Do total empenhado, quem mais recebeu recursos foi o estado do Rio de Janeiro, grande vítima de enchentes em sua região serrana no início de 2011, com cerca de 20%. Depois, Santa Catarina, que passou por um grande estrago em 2008. Pernambuco, que sofreu em 2010, foi o terceiro.
Mas não bastava ao ministro explicar que não havia “bairrismo”. O mundo polític em Brasília ainda exigira que algumas arestas fossem aparadas em meio à “polêmica”.
No mesmo dia da entrevista de Bezerra, Gleisi Hoffmann distribuiu nota à imprensa para desmentir a tese de que era “interventora”. Disse a ministra: “Esclareço que não recebi por parte da presidenta da República nenhuma orientação ou determinação para intervir na execução orçamentária do Ministério da Integração Nacional. O ministro Fernando Bezerra é e continua sendo responsável pela execução dos programas e projetos daquela Pasta. Qualquer informação fora deste contexto tem por objetivo disseminar intriga”.
O PT também precisava fazer sua parte para, depois que um membro graúdo do partido, o secretário de Comunicação, tinha colocado lenha na fogueira em que Fernando Bezerra ardia e alimentado a “intriga” citada por Gleisi. Nesta sexta-feira (6), o presidente do partido, Rui Falcão, também soltou nota para acalmar o PSB. “Para o PT, o episódio está encerrado e não abala nem um pouco as relações políticas com o seu aliado, o PSB.”
André Barrocal, na Carta Maior
BRASÍLIA – Mais um ano começa com tragédias provocadas pelas chuvas que marcam esta época. O principal palco dos estragos até agora é Minas Gerais, onde pessoas morreram e uma centena de municípios já decretou situação de emergência. Os governos federal e estadual correm para socorrer vítimas, acolher desabrigados, liberar dinheiro, planejar a recuperação do destruído.
Ao mesmo tempo em que causa problemas concretos no mundo real, as chuvas também produziram consequências não muito longe de Minas, mas num mundo mais virtual, a política. Nascido na capital brasileira, o “aguaceiro” espraiou-se pelo país por meio de TVs, rádios, jornais, blogs da internet na forma de uma polêmica que talvez não mereça o adjetivo.
O motivo foi a suposta preferência explícita do ministro responsável pelo gasto de recursos federais destinados a prevenir enchentes por aplicá-los em seu estado de origem. Por trás da predileção de Fernando Bezerra por Pernambuco, estaria um interesse político de quem estaria de olho em uma candidatura a prefeito de Recife em outubro.
A tese de gestão eleitoreira de Bezerra foi sustentada com base na seguinte informação: de R$ 29 milhões em dinheiro liberado pelo ministério da Integração Nacional para obras contra enchentes em 2011, R$ 25 milhões foram para Pernambuco.
A informação foi levantada primeiramente por uma ONG chamada Contas Abertas, especializada na vigilância do gasto público. A entidade é de um deputado federal, Augusto Carvalho (DF), que pertence a um partido adversário do governo Dilma Rousseff, o PPS. A informação foi repassada pela ONG para um grande jornal, que a publicou na última terça-feira (3).
No mesmo dia, uma das ministras mais próximas da presidenta, Gleisi Hoffmann, da Casa Civil, abreviou as férias e voltou ao batente, por ordem da chefa, que só retomaria o trabalho nesta sexta (6). A entrada de Gleisi em cena foi vista pelo mundo político como uma intervenção presidencial na pasta do “politiqueiro” ministro Fernando Bezerra, que seria “enquadrado” a partir dali.
No dia seguinte, o secretário de Comunicação do PT, deputado federal André Vargas (PR), daria uma declaração a um jornal do estado dele, chamando de “equívoco” o “privilégio” dado por Bezerra, que é do PSB, ao próprio estado na liberação de recursos. E garantindo que “a presidente Dilma não concorda com esse tipo de gestão.”
Um ministro sem atitude republicana, como se viu em números. Uma presidenta irritada e disposta a enquadrar o auxiliar, por meio de uma interventora. O partido dela fazendo coro à denúncia de uma ONG de oposição e condenando em público um aliado histórico do PT, o PSB. Aliado que é presidido por um político em ascensão, Eduardo Campos, que vê as eleições presidenciais de 2014 com certas ambições e que é, justamente, governador de Pernbambuco. Pronto, estava criada a polêmica.
Mas, será que haveria mesmo motivo para uma? Na última quarta-feira (4), o ministro acusado de bairrismo convocou a imprensa para dar explicações. E, pelos dados que apresentou na entrevista, talvez mereça crítica mais por dificuldade de gastar todo o dinheiro que tinha à disposição, do que por privilegiar o próprio estado.
Em 2011, a Integração tinha R$ 366 milhões para investir em prevenção de enchentes. Empenhou, primeiro ato de um gasto público, 70% – mais de R$ 100 milhões não foram usados. E pagou de fato só R$ 29 milhões.
Destes pagamentos realizados, 90% foram mesmo para Pernambuco. Mas, disse o ministro, porque o estado tinha sido quem mais pedira verba federal depois que, em 2010, passou por uma das maiores tragédias causadas por chuvas na história brasileira, com mais de 18 mil famílias atingidas.
Aquela tragédia levara o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, a fazer um acordo com Dilma Rousseff para construir diversas barragens no estado, ao custo de R$ 600 milhões, de forma rateada com o governo federal. Era um dos estados com projetos em estágio mais avançado de elaboração e em mais condições de efetivamente receber dinheiro federal.
Segundo Fernando Bezerra, o que também mostra que não houve bairrismo no ministério, é a análise do resto do orçamento. No ano passado, as ações posteriores a enchentes – socorro a pessoas com alimentos e remédios ou reconstrução de estradas, por exemplo – , tiveram empenho de R$ 910 milhões por parte do ministério. Só a metade foi paga.
Do total empenhado, quem mais recebeu recursos foi o estado do Rio de Janeiro, grande vítima de enchentes em sua região serrana no início de 2011, com cerca de 20%. Depois, Santa Catarina, que passou por um grande estrago em 2008. Pernambuco, que sofreu em 2010, foi o terceiro.
Mas não bastava ao ministro explicar que não havia “bairrismo”. O mundo polític em Brasília ainda exigira que algumas arestas fossem aparadas em meio à “polêmica”.
No mesmo dia da entrevista de Bezerra, Gleisi Hoffmann distribuiu nota à imprensa para desmentir a tese de que era “interventora”. Disse a ministra: “Esclareço que não recebi por parte da presidenta da República nenhuma orientação ou determinação para intervir na execução orçamentária do Ministério da Integração Nacional. O ministro Fernando Bezerra é e continua sendo responsável pela execução dos programas e projetos daquela Pasta. Qualquer informação fora deste contexto tem por objetivo disseminar intriga”.
O PT também precisava fazer sua parte para, depois que um membro graúdo do partido, o secretário de Comunicação, tinha colocado lenha na fogueira em que Fernando Bezerra ardia e alimentado a “intriga” citada por Gleisi. Nesta sexta-feira (6), o presidente do partido, Rui Falcão, também soltou nota para acalmar o PSB. “Para o PT, o episódio está encerrado e não abala nem um pouco as relações políticas com o seu aliado, o PSB.”
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.