Primeiro, empresa considerou ferroviários culpados por sua própria morte. Agora, fala-se em "sabotagem" nos acidentes...
Para membros do governo paulista e CPTM, trabalhadores que morreram em acidentes de trem podem ter praticado “sabotagem”…
Por Rogério Centofanti
Participei no início do mês passado, na condição de representante do Sindicato dos Ferroviários de Trens de Passageiros da Sorocabana – SINFERP -, de um programa de rádio em Osasco (SP), com feitio de roda viva. No centro da roda, fui bombardeado por questões sobre transporte de pessoas sobre trilhos em São Paulo, em especial na CPTM.
Foi muito bom, pois animado por condutores inteligentes, sérios, e dotados de uma competência cada dia mais rara: a indignação.A pergunta mais provocativa veio logo de início, e foi mais ou menos a seguinte: “Você não acha que há excesso de problemas justamente em ano eleitoral?”.
Sei que o jornalista nem mesmo acredita no que perguntou, mas valeu como provocação, e serviu para que eu começasse a preparar-me para lidar com a nova-velha “tendência”.
Respondi, com humor habitual, mais ou menos o seguinte:
Quando da morte de cinco ferroviários, e a imediata sentença de que eram culpados pela própria morte, decretada pela CPTM, não encontrei outra razão para tamanho nonsense do que imaginar que a empresa estivesse repleta de suicidas.
Divaguei, também, sobre a possibilidade de maquinistas homicidas, que saiam pelas linhas caçando colegas desatentos. Talvez uma relação sadomasoquista entre eles.
Agora, disse, você insinua a velha e famosa suspeita de que possam estar eventualmente praticando sabotagem, com o intuito de desestabilizar o governo de plantão. Esse apelo foi comum à época que a CPTM foi presidida por um carioca absolutamente desconhecido no meio metroferroviário paulista. Tudo, absolutamente tudo o que acontecia de errado na empresa, era depositado na vala comum da sabotagem.
Nem mesmo vandalismo – mas sabotagem.
Vandalismo, eu disse, significa apontar o dedo na direção de uma população difusa. Sabotagem, entretanto, pressupõe o ato intencional de produzir um dano e, nesse sentido, aponta de forma direta para uma pessoa ou grupo de pessoas com interesse bem definido quanto aos resultados de suas ações.
Não disse tudo isso exatamente com estas palavras, mas como o programa foi gravado, posso assegurar ao menos o espírito das colocações.
Pois bem: passado um mês dessa participação, e não é que CPTM e secretário dos Transportes Metropolitanos aparecem com suspeita de sabotagem – pelo excesso de coincidência de falhas – sobre o que pode ser devido a atos de vandalismo, ou falhas mesmo? Claro que, cautelosos, falam em “indícios”, mas plantam um clima de suspeição grave, e que recai de forma difusa sobre todos que, teoricamente, possam tirar algum proveito de problemas na empresa, tais como falhas ou mesmo acidentes.
Nessa medida, saem do corner em que estão acuados diante de pressões da opinião pública, e correm para o banco das vítimas. “Não somos nós, mas os sabotadores”. Esse era o desejo do emprego do termo, ao menos no passado.
A mera suspeita tornada pública é extremamente grave, e não pode ser lançada ao vento de modo indiscriminado. Motivo? Gera pânico, e de forma inconsequente. A simples suspeita é motivo para envolver setores especializados em investigações criminais – uma vez que se fala em crime -, encontrar os culpados e trazê-los a luz.
O sindicato nunca teve prática nem mesmo assemelhada.
Disse que foram removidos os sensores de descarrilamento dos trens novos, e foram. Disse que maquinistas eram obrigados a desligar o sistema automático de velocidade de bordo, e eram. Disse que algumas vezes os trens “sumiam” dos monitores dos controladores do CCO, e sumiam. Disse que havia problema em rede aérea e em subestações de energia, e agora estão sendo corrigidos. Diz ainda hoje que há problemas com sistema de sinalização e comunicação. Diz que é um equívoco deixar manutenção de trens aos cuidados de empresas terceirizadas. Diz que é arriscado reduzir o intervalo entre trens com as práticas e problemas acima apontados. O sindicato diz onde estão os problemas da empresa, e que podem redundar em falhas e acidentes. Não os inventa, e tampouco os cria. Apenas os aponta.
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