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quarta-feira, 23 de novembro de 2011

E a democracia?



A democracia “está acabada”, diz James Galbraith, filho do economista famoso, John Kenneth Galbraith, em entrevista à Folha, hoje.
Ele prossegue: “Na Grécia temos uma pessoa que foi indicada para primeiro-ministro que nem é membro do parlamento. Na Itália, Mario Monti foi indicado senador vitalício justo antes de virar primeiro-ministro. O fato é que esses dois primeiros-ministros foram ditados por Berlim, Bruxelas, Paris. Não foram escolhidos pelas populações de seus países.”
James Galbraith recorda que boa parte dos executivos que assumiram postos de mando na Europa são ligados ao Goldman Sachs, um dos grandes bancos de investimentos do mundo. Sua tese é que esses executivos se apossaram de cargos políticos e agora encaminham as decisões que irão definir o futuro da economia mundial.

O debate sobre a democracia é importante.
Não acho que a democracia está acabada mas é claro que se encontra numa situação complicada. Como aquele paciente em estado grave que não é capaz de decidir sobre a equipe médica que vai tratá-lo nem sobre o tratamento a ser seguido. As decisões são tomadas num aposento ao lado, onde a direção do hospital (ou seriam os bancos, como sugere o economista?) resolve o que vai fazer e impõe suas idéias ao paciente, muitas vezes desacordado.
Registrei aqui a reação dos fanáticos do mercado quando o ex-primeiro ministro Georges Papandreou ameaçou convocar um referendo para aprovar (ou não) o novo plano de austeridade da União Européia. Papandreou não durou 72 horas no cargo, vocês se lembram.
O curioso é que, mesmo tendo sido substituído por um primeiro ministro considerado de confiança pelos mercados, até agora a situação não se modificou. O governo grego ainda não teve acesso a um pacote 8 bilhões de euros, que fora prometido caso se mostrasse um aluno bem comportado e aceitasse submeter a população do país a novos sacrifícios, que Papandreou achava tão amargos que queria ajuda da oposição para aprová-los.
O governo espanhol acaba de ser trocado. Sairam os socialistas e retornaram os conservadores. Os números são estrondosos e ajudam a mostrar como o eleitor reage quando se sente abandonado por um partido que prometia defender sua história e seu padrão de vida.
Olhando para a substancia, nada se modificou. Os socialistas foram expulsos do poder em função da crise. Mas os conservadores retornam para dar sequencia a mesma política de seus antecessores. Se houver mudança, será para pior.
Assim, o eleitor que votou em protesto contra a situação econômica – e não há dúvida que este foi o ponto decisivo da eleição – em breve estará cansado e desiludido. Isso é que enfraquece um regime democrático: o sujeito vai à urna, vota, e nada acontece. Ou melhor: acontece o contrário daquilo que é esperado.
O pior é que a desmoralização dos socialistas atingiu um ponto tão alto que o PP nem precisou prometer muita coisa para receber uma tempestade de votos.
É uma situação semelhante à que se viu na Italia. As ruas gritam que não querem austeridade, mas crescimento. Como o bunga-bunga Berlusconi tornou-se uma ameaça à austeridade, providencia-se uma mudança de governo que terá impacto decisivo sobre o futuro de cada cidadão sem chamar a população para dizer o que pensa.
Nos Estados Unidos, a célebre comissão de democratas e republicanos não conseguiu chegar a um acordo para fazer cortes de 1,2 trilhão de dólares no orçamento do país. É menos grave do que parece, sustentou o Premio Nobel Paul Krugman, dias atrás.

Por que? Em função do poder exagerado dos lobistas do capital financeiro, somado a vontade republicana de bloquear qualquer melhoria na economia americana em véspera de eleição presidencial, a paralisia tornou-se o menor dos males, escreveu Krugman. Ele estava convencido de que qualquer acordo possível, naquelas circunstancias, produziria resultados ainda mais prejudiciais à economia do país.
Vamos combinar: quando um Premio Nobel acha melhor que os parlamentares fiquem de braços cruzados em plena crise é porque o ambiente político atingiu um patamar de catástrofe.
Este é o perigo.
A experiencia ensina que, em situações como esta, os políticos podem se transformar nos principais coveiros das convicções democráticas da população. Sem respostas claras e necessárias para enfrentar a crise, abrem a porta para idéias autoritárias.
A maioria das pessoas gosta de recordar do lado bom da crise de 1929, que foi o New Deal construído pelo governo Roosevelt. Era uma plataforma de crescimento e distribuição de renda, que tirou os EUA da crise. Mas havia um lado ruim também.
Em países onde não se encontrou uma saída para a enfrentar o desemprego e retomar o crescimento, abriu-se o caminho para idéias autoritárias. O caso notável de estudo é a Alemanha, que deixou seu destino nas mãos dos fanáticos do mercado da época. Com o desemprego batendo recordes históricos, eles se recusavam a estimular o crescimento e a recuperar o poder de compra das famílias. Olhando para o retrovisor, estavam de olho na ameaça inflacionária — que era um problema do passado bem distante.
O resultado é conhecido. Em 1929, Hitler era considerado um maluco que discursava nas cervejarias de Munique e seu partido não passava de uma organização com 2,5% de votos. Em 1933, os nazistas se tornaram os mais votados e Hitler assumiu o poder.
Personagens de uma mesma época, Roosevelt e Hitler representaram idéias opostas para problemas muito parecidos. Era a economia, estúpido! Mas também era a política.
Paulo Moreira Leite


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