Há alguns anos, o setor sucroalcooleiro e seus representantes se apresentaram ao mundo como grandes produtores de um combustível limpo e renovável, que seria capaz de prover 10% do consumo de gasolina do Planeta, algo como 200 bilhões de litros. A realidade de 2011, quando quase a maioria da cana no Brasil, localizada 90% no Centro-Sul já está colhida, é bem diferente. Haverá uma redução de produção que deve variar de 15% a 20%. Haverá menos etanol, mais carro, e uma crise internacional, que já fechou os cofres dos fundos de investimentos. O artigo é de Najar Tubino.
Existe uma diferença entre projeto e realidade. Entre plano de expansão e o cotidiano da produção. Alguns anos atrás, o setor sucroalcooleiro e seus representantes se apresentaram ao mundo como grandes produtores de um combustível limpo e renovável, que seria capaz de prover 10% do consumo de gasolina do Planeta, algo como 200 bilhões de litros. Um projeto para 2025, conforme o Núcleo de Estudos e Pesquisas Energéticas da Unicamp, grupo que reúne especialistas em cana-de-açúcar e álcool, e responsáveis por muitas pesquisas favoráveis a esta hipótese.
A realidade de 2011, quando quase a maioria da cana no Brasil, localizada 90% no Centro-Sul já está colhida, é bem diferente. Haverá uma redução de 15%, alguns casos de regiões produtoras como Ribeirão Preto (SP), que a quebra será quase 20%. Serão moídas 490 milhões de toneladas, longe da previsão de 560 milhões. No ano passado a previsão era de 595 milhões e foram colhidas 555 milhões.
Menos cana, significa menos açúcar e álcool. No primeiro caso 33,4 milhões de toneladas, e no segundo, 25,2 bilhões de litros. Dados oficiais da União da Indústria Canavieira (Unica), referentes à safra 2010-11. Oficialmente a safra encerra em março do próximo ano, embora a colheita termine no mês de dezembro. Portanto, os números de previsões das entidades e de consultorias especializadas são relativos à safra 2011-12. E aí está o problema.
Crise e endividamento
Como grande produtor de etanol hidratado, usado diretamente no tanque dos veículos de passeio, as usinas brasileiras aceleraram as metas futuras, antes da crise financeira de 2008. Grandes grupos nacionais, como Santelisa-Vale, Cosan, São Martinho investiram em compras de outras usinas, em expansão do plantio e em aumento da capacidade industrial. Porém, com a crise e a rápida recessão econômica, principalmente falta de crédito, além da perda de R$ 4 bilhões em derivativos, levaram muitas dessas empresas a um elevado endividamento. Caso maior da Santelisa-Vale, dona de sete usinas, que foi absorvida pelo parceiro internacional, a família belga Dreyfus, da gigante Louis Dreyfus, que trabalha com açúcar e álcool, além de soja, milho, entre outras coisas. A dívida era de R$3 bilhões.
Formou-se então a Louis Dreyfus-LDC, com participação minoritária da família Junqueira Franco, especialista no setor, com participação no grupo Moema, também vendido.
Começou a primeira etapa do quebra-cabeça. A Cosan, maior grupo de usinas do país – são 23, sendo 21 em São Paulo- comprou a Novamérica, da marca União, conhecida de todos os brasileiros. Comprou os ativos da Exxom Mobil no Brasil, a rede de postos Texaco, com 1.700 estabelecimentos e 240 lojas de conveniência. Dois anos depois, formou uma joint venture, uma associação com a Schell, representando 21,2% do mercado de combustíveis, atrás da Br Distribuidora (Petrobras) e do Grupo Ultra (comprou a Ipiranga). Nasceu a Raízen com capacidade de moagem de 60 milhões de toneladas e um faturamento de R$ 40 bilhões.
Um detalhe curioso: a Cosan Limited, controladora da Cosan, de Rubens Ometto Silveira de Mello, tem sede nas ilhas Bermudas, no Caribe, conhecido paraíso fiscal. Entre as figuras do Conselho de Administração dois ex-ministros: Marcos Vinicius Pratini de Moraes (Agricultura) e Maílson da Nóbrega (Fazenda), que por sinal participa de 7 conselhos empresariais. E mais o ex-governador e advogado, de Nova York, George E. Pataki (de 1995 a 2007).
Dez maiores grupos
A consolidação do setor sucroalcooleiro foi grande no período pós-crise. Durante alguns meses de 2011, junto com o economista Luam Tubino, pesquisamos os 10 principais grupos desse setor. Uma parte dele é composto por grupos internacionais, como os já citados Louis Dreyfus, Schell, depois seguidos por Bunge, Tereos, Noble, Shree Renuka, BP PLC, e com menos importância em termos de expressão de produção, ADM e Cargill, as gigantes dos cereais no mundo, sendo a ADM a maior em produção de álcool, feito a base de milho, nos Estados Unidos. Ou seja, trata-se de um quebra-cabeça internacional.
A maior participação está na Schell, que detém 50% das três empresas criadas pela joint venture com a Cosan. É o maior grupo do país e pretende quase duplicar a produção - de 60 para 100 milhões de toneladas- até 2020. Na verdade todas as empresas têm a perspectiva de duplicar ou triplicar a produção. A Cosan tem uma área de 350 mil hectares de cana. Outro dado importante: 70% da área plantada pertence às indústrias, ou porque são proprietárias diretas, ou trabalham com o pacote de arrendamento - custa 12 toneladas no Centro-Oeste e 18 toneladas no Sudeste, por hectare.
No grupo das 10 maiores, outro caso emblemático, é o da ETH-Brienco, do grupo Odebrechet. A Brenco tinha sido criada por fundos de investimentos, onde participavam a Tarpon Investment e a Ashmore International, e figuras conhecidas como Vinod Kosla, da Sun Microsystem e o ex-presidente do Banco Mundial, James Wolfsohen. Era presidida por Henri Philippe Reichust, ex-presidente da Petrobras. Tinham recebido R$ 1,5 bilhão do BNDES e mais uma parcela dos sócios de cerca de US$ 200 milhões. Com a crise, o projeto de erguer quatro usinas não vingou. Resolveram unir os ativos com a ETH, cujo plano era construir 10 usinas e ser o segundo maior grupo do país – a Odebrechet além de construtora, tem muitos planos na área energética e defesa, sendo sócia minoritária em Belo Monte, e controladora da Brasken.
Apetite internacional
A ETH-Brenco conta com 9 usinas e capacidade de moagem de 14 milhões de toneladas, mas até 2013 pretende fechar as 10 usinas, produzir 40 milhões de toneladas de cana e 3 bilhões de litros de álcool. O grupo Louis Dreyfus possui 13 usinas, 5 delas no nordeste, e capacidade de 40 milhões de toneladas, e área de 450 mil hectares. O diretor-presidente, Bruno Melcher, comentou recentemente a questão da concentração do setor. Segundo ele, ainda é baixa, porque as cinco maiores empresas detém 25% do mercado, enquanto na soja, o mesmo percentual é de 64%, no processamento, em papel e celulose é de 73% e no suco de laranja 92%. Ou seja, a consolidação vai continuar.
Seguindo o roteiro dos 10 maiores. A Açúcar Guarani, com 7 usinas, 18 milhões de toneladas de capacidade, foi comprada pela Tereos Internacional, que é a controladora e tem 33 plantas espalhadas pelo mundo (um grupo de cooperativas francesas), mas uma parte, 45,7% da Açúcar Guarani, não da holding, foi adquirida no ano passado pela Petrobras por R$ l,6 bilhão. E a São Martinho, 3 usinas, sendo a maior em Pradópolis, considerada a primeira do mundo em processamento (mais de 8 milhões de toneladas), capacidade acima de 13 milhões de toneladas. Associou-se a Petrobras na Usina Boa Vista, em Goiás, criando uma nova empresa, a Nova Fronteira Bioenergia.
Outro destaque é a Bunge, com sede nos Estados Unidos, onde tem 2 usinas (450 milhões de capacidade), e no Brasil comprou a Moema Participações, do usineiro Maurílio Biagi Filho, que tinha uma usina e participação em outras 5. A Bunge foi comprando as participações e ainda inaugurou em julho a usina Pedro Afonso (TO), onde investiu US$ 600 milhões. É presidida no Brasil pelo ex-ministro Pedro Parente (Planejamento, era FHC). A próxima é outro caso de investimento diversificado, pois está ligado ao grupo Bertin, que é sócio da JBS, sempre foi tradicional proprietário de frigoríficos (marca da cidade de Lins, onde ficava a sede, uma planta que funcionava 24 horas, agora comandada pela JBS). Bertin assumiu 3 usinas da Infinity Bionenergia, que estava em recuperação judicial, com dívidas de R$ 500 milhões. Era comandada pelo fundo de investimento Kidd & Company e da consultoria Worldinvest, do empresário Sérgio Thompson Flores. O Bertin ainda tem sociedade em duas outras usinas no MS, uma delas com, o empresário José Bumlai, figura conhecida do agronegócio. Pretende até 2016 moer 25 milhões de toneladas de cana.
Três petrolíferas
No Paraná temos um grupo forte nacional, a Usaçucar, conhecido por Usina Santa Terezinha, mas na realidade reúne 8 usinas, com capacidade para moer mais de 16 milhões de toneladas, pertence à família Meneghetti, conta com 245 mil hectares de cana. No grupo das internacionais entrou a trading de Hong Kong, Noble Group, tinha 2 usinas em São Paulo, comprou outras duas do grupo Cerradinho, aumentando a capacidade de moagem para 17 milhões de toneladas. Pagou R$ 600 milhões e assumiu dívidas de R$ 1 bi. A Noble trabalha com processamento de grãos e fertilizantes em vários continentes. Aliás, duas outras tradings participam do setor sucroalcooleiro: a Sojitz, japonesa, tem 33% da ETH, portanto, sócia da Odebrechet. A Itochu, também japonesa, tem 20% da usina Pedro Afonso, da Bunge.
Os indianos estão representados no Brasil pela Shree Renuka Sugars com duas usinas compradas da Equipav Açúcar e Álcool e duas outras adquiridas no Vale do Ivaí (PR), alcançado a capacidade de 15 milhões de toneladas. Pagaram R$ 600 milhões e assumiram R$ 1,5 bi em dívidas. Pretendem construir mais uma usina e já ampliaram a área de plantio em 100 mil hectares.
A última a entrar no circuito foi a BP PLC, também conhecida por British Petroleum, comprou 83% da Companhia Nacional de Açúcar e Álcool, com 2 usinas. Pertencia a um pool de fundos de investimentos, liderados pelo Riverstone e Goldman Sachs. A dívida era de R$ 1 bi, sendo R$ 672 milhões do Riverstone, que queria sair do negócio. Temos no quebra-cabeça três petrolíferas: Schell, BP e Petrobras.
Mais de 100 usinas
A respeito do endividamento das usinas brasileiras, no ano passado, o banco de investimentos do Itaú (BBA) divulgou um relatório. Analisando 66 grupos, com capacidade de moagem de 450 milhões de toneladas ( a capacidade industrial no Brasil é de 600 milhões, com 434 usinas). Segundo o estudo, 65%, ou 31 grupos, a maior parte estava em condições de retomar os investimentos. Uma parte, 16 grupos (80 milhões de toneladas), estava na fase de ajuste financeiro, reduzindo a alavancagem, termo técnico de endividamento, distante do patrimônio líquido. E 19 grupos (78 milhões de toneladas) precisavam fazer alguma operação estratégica para reduzir o endividamento. Em alguns casos, já citados, foram comprados.
Para a Unica, entidade das usinas, na opinião do diretor técnico, Antônio Pádua Rodrigues, o Brasil tem condições de mudar o cenário nos próximos 10 anos. Seriam construídas mais 100 usinas, com investimentos de US$ 80 bilhões, que agregariam mais 400 milhões de toneladas. Entre 2005 e 2010, o Centro-Sul recebeu US$ 50 bilhões para construção de 112 usinas (ou 98, conforme a fonte). A capacidade dobrou para 600 milhões de toneladas. Somente o BNDES participou com US$ 27,1 bilhões. Em 2011, até setembro, o BNDES liberou R$ 3,8 bilhões. De qualquer forma, ressalta Antônio de Pádua, precisaria ter cana-de-açúcar.
O quebra-cabeça também envolve previsões na década (2010-2019), incluídas no planejamento da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), responsável pelo planejamento da área de energia do governo federal. Prevê um crescimento de consumo de etanol, no caso o hidratado, de 90% nos próximos 10 anos. A produção de etanol (inclui o anidro, usado na mistura com a gasolina), iria de 33,7 bilhões de litros para 64,0 bilhões de litros. Na safra 2010 o Brasil produziu 25,2 bilhões de litros, uma diferença de 8 bilhões. A evolução do consumo será de 6,8% ao ano, pulando de 29 bilhões de litros de etanol combustível para 52,4 bilhões, tendo como principal causa o aumento da frota de carros flex-fluel. Em 2019, 30 milhões de carros usarão álcool hidratado. A frota atual de carros flex-fluel, segundo a Anfavea (associação das montadoras), é de 12,5 milhões. A frota brasileira em 2019, segundo a EPE, terá 39,7 milhões, sendo 77,9% flex-fluel. E a produção de cana atingiria 1,135 bilhão de toneladas.
Consumo continua caindo
Dos últimos anos, da pré-crise financeira até agora, o maior consumo de etanol hidratado foi em 2009, quando os preços foram os menores. O consumo chegou a 16,5 bilhões de litros. Em 2010, caiu para 14,9 bilhões. E, este ano, cairá mais ainda. Segundo as previsões do setor, abaixo de 12 bilhões de litros.
O preço do etanol em 2009, segundo a Fipe, fundação econômica de São Paulo, foi de R$ 1,392 o litro. Em 2010 subiu para R$ 1,537, e este ano alcançou em julho, em plena safra da cana, R$ 1,975, quando soou o alarme no governo federal, e passaram a considerar o etanol como combustível estratégico, não mais um produto agrícola, sob a fiscalização da Agência Nacional do Petróleo.
O preço do etanol na visão das usinas precisa mudar de patamar. Não pode ser mais a referência da gasolina, no caso, 70% quando passa a ser deficitário colocar álcool no tanque. Atualmente, conforme a ANP, somente estados do Centro-Oeste, como Mato Grosso, Goiás e Tocantins, tem um projeto abaixo da percentagem. São Paulo estava no limite, na metade de outubro. As usinas querem menos impostos estaduais e preço livre, o que significaria, a liberação do preço da gasolina no país, se contarmos os 20% de mistura atual. Já houve uma redução de 5%. Na verdade, o que as usinas, e aí estão os grupos multinacionais, querem é a transformação do álcool numa commodity, uma mercadoria, com preços em bolsas internacionais cotados ao sabor do mercado.
Ou, como disse, o diretor da Schell, para a área de energia alternativa, Mark Gainsborough:
- "Os biocombustíveis deveriam ir para os mercados em que valem mais”.
Ele está se referindo a um mercado de mais de 100 bilhões de litros no mundo, e onde a Schell, que investe US$ 1,3 bilhão em pesquisa e desenvolvimento, espera que os combustíveis vegetais substituam 20% do consumo mundial de fósseis. Ela investe pesado em etanol de segunda geração, poderá produzir álcool a partir do capim, de algas, ou da própria palha da cana. Tudo ainda muito caro, e na seção hipótese, do quebra-cabeça.
Não haverá cana nova
Não só isso. Mudar a estrutura atual, para uma nova indústria não é coisa pequena, muito menos a curto prazo, sem contar que custa mais caro produzir o etanol celulósico, em relação à cana. Já temos um problema sério agora, e maior no próximo ano: não haverá cana, novamente.
A consultoria F&G Agro, de Ribeirão Preto, nas palavras do sócio Gustavo Corrêa, sobre a safra 2010-11, encerrada em março:
- O que ocorreu em 2010-11 não foi consequência apenas da estiagem do segundo semestre do ano passado. Houve também falta de cana-de-açúcar no mercado. As unidades produtoras contabilizaram sua moagem a partir do que iriam receber da cana dos fornecedores. Mas parte dessa cana não existia. Os investimentos não foram feitos. Até mesmo para 2012 não haverá um grande volume de cana nova. Para isso acontecer a área já deveria estar arrendada e preparada. A renovação está ocorrendo marginalmente em usinas que estão ampliando a capacidade. A expansão de canaviais em regiões novas deve se limitar a cerca de 3% da área do Centro-Sul.
A produtividade da cana-de-açúcar pode chegar a 85 toneladas por hectare, a média brasileira (Centro-Sul) está acima de 70 toneladas. São realizados cinco cortes, até a produtividade cair. Quer dizer, a cada 5 anos precisa haver uma renovação dos canaviais. Então, chegou a crise de 2008, as usinas se endividaram, os investimentos foram congelados, e o dinheiro que entrou, foi para comprar as indústrias.
Mas as montadoras continuaram vendendo carros flex. De 2010 até agora, cerca de 3 milhões de novos veículos estão rodando. O consumo da gasolina e do etanol aumentou 2,1% em 2011, segundo a pesquisa da FNP Informe Economics. A participação do etanol foi a menor nos últimos anos (hidratado): 25%. Se somarmos o anidro a participação é de 40%. O consumo do hidratado ficou em 11,58 bilhões. Os outros 75% do consumo, ou seja, 34,26 bilhões de litros, foi de gasolina C. O preço médio do etanol, ficou 32% maior, em relação a 2010.
Retorno incerto
O cenário de abundância de etanol não vai acontecer, diz o presidente da SCA Trading, uma das sete empresas que dominam a distribuição no Brasil, Martinho Seiiti Ono:
- O perfil das empresas que lideram esse mercado mudou pós-crise de 2008. São multinacionais e fundos de private equity, caracterizados por uma racionalização de retorno de investimentos. E, hoje, não há certeza de que o capital aplicado em projetos novos de etanol vai oferecer retorno.
Uma opinião bem mais potente, corrobora na argumentação do distribuidor. É o vice-presidente global da Cargill, o brasileiro Sérgio Rial, falando num evento da Câmara de Comércio Brasil-EUA, sobre o posicionamento do grupo em relação ao etanol. A Cargill não considera o produto estratégico, embora tenha duas usinas em atividade:
- Construir uma usina não custa menos de US$ 150 por tonelada. Esses valores são muito altos. "Você precisa estar apostando em cotações de etanol e açúcar muito elevadas”, diz ele, com o cacife de ser a maior compradora de grãos do Brasil.
Redução do etanol
O quebra-cabeça esquenta com o açúcar. Nos últimos dois anos houve uma quebra na produção mundial, principalmente, na Índia, grande consumidora e produtora. O volume de açúcar para 2011 está em torno de 174 milhões de toneladas – o Brasil exportou 26 milhões em 2010. As cotações do açúcar, que é uma mercadoria cotada em bolsa, sujeita aos investimentos financeiros globais, atingiu a maior cotação em 29 de dezembro de 2010 – mais de 34 centavos de dólar por libra peso. O chamado mix industrial, o que a usina vai produzir de açúcar ou álcool, no ano passado foi de 44,7% para açúcar e 55,3% para álcool. Na safra 2011-12º mix será de 45,3% açúcar e 54,7% álcool. Ou seja, vai haver redução de etanol hidratado de 17,9 bilhões de litros para 17,2 bilhões de litros – são 700 milhões de litros a menos.
As previsões do mercado internacional apontam para uma sobra de 5 a 6 milhões de toneladas de açúcar. Mas o caso é que os preços continuam altos e o retorno financeiro é maior no açúcar. Não é à toa que o governo federal reduziu a taxa da CIDE sobre a gasolina, porque as importações aumentaram: 32 mil barris/dia contra 9 mil, em 2010. O Brasil está no limite da produção interna. O consumo vai continuar crescendo, as vendas de carros novamente baterão recordes acima de 3 milhões de veículos.
Outro distribuidor, Tarcilo Rodrigues, da Bioagência, que no início do ano já antecipava o aumento no preço do litro do etanol em 5%, em função da queda nos investimentos nos canaviais nos últimos dois anos, além da estiagem, comenta a mudança no setor:
- "A própria concentração do segmento aprofundada pelo apetite de grandes multinacionais altera a dinâmica do mercado, já que muitas usinas estão se organizando em grupos, para equilibrar as forças na venda de biocombustíveis, ao já concentrado mercado dos distribuidores”.
Cube fechado
As empresas que distribuem etanol são formadas por usinas ou atendem grupo de usinas, caso da Coopersucar, se especializou na comercialização e tem 39 associados. A SCA atende várias usinas, mesmo caso da Bioagência, além da CPA, onde os paranaenses da Usaçucar são sócios. A Louis Dreyfus comercializa, mesmo caso da Guarani, mais a Allicom, onde participam São Martinho, São José e Santa Cruz e está formado o grupo dos distribuidores.
É claro que as multinacionais não querem somente o mercado interno. A própria Bunge produz etanol nos Estados Unidos e pretende comercializar 500 milhões de litros a partir do Brasil em 2012 – vende para as Filipinas, onde a mistura subiu de 5 para 20%. Na inauguração da usina Pedro Afonso, o diretor global da Bunge, Bem Pearcy, falou claramente:
- "O que falta ao etanol é um mercado sem barreiras, assim como ocorre com outras commodities, com as quais já operamos, como açúcar e soja”.
Nas oito usinas do Brasil a Bunge pretende produzir 900 milhões de litros no ano que vem. O apetite pelo comércio internacional aumentou com a queda dos subsídios dos produtores de milho dos Estados Unidos. Ainda falta derrubar a tarifa de 0,54 centavos de dólar por galão (3,78 litros). Mesmo assim as exportações ocorrem, porque o etanol brasileiro entra no território americano como combustível avançado, segundo definição da Agência Ambiental. Produz 50% menos emissões de gases estufa. No final das contas mesmo com tarifa, as usinas estavam ganhando 0,50 centavos de dólar por galão de ágio este ano, na venda para os Estados Unidos. O preço do galão custa US$ 3,70 enquanto o etanol do milho US$ 2,80.
2012, a dura realidade
Com o dólar baixo aconteceu o inverso também. Importaram cerca de 1,5 bilhão de litros, deverá chegar até março de 2012. É um quebra-cabeça complicado. O governo acena com aumento de crédito para estocagem de etanol, e incentivo para construção de novas indústrias. É àquela história inicial: entre o projeto e a vida real, há uma distância relevante.
Não é simplesmente pular de 8 milhões de hectares de cana para quase 12 milhões, conforme a pesquisa da EPE, com produção saindo das 500 milhões de toneladas para mais de 1 bilhão. Envolve a expansão da fronteira agrícola, do mercado de terras, da disputa com soja e eucalipto para produção de energia, em fornos das siderúrgicas. No estudo da Unicamp, que o Brasil atingiria 200 bilhões de litros em 2025, a área aumentaria muito. Nos cálculos divulgados desde o início dos anos 2000, o Brasil teria 300 milhões de hectares, onde a cana poderia ser plantada. Pelo menos 10%, 30 milhões de hectares, supririam a necessidade da produção de cana. Significa pular de 8 para 30 milhões de hectares.
A maior lavoura do país, a soja, que aumentou significativamente a área na última década, atingiu 25 milhões de hectares. O ano de 2012 não será marcado apenas pelas previsões dos maias. Haverá menos etanol, mais carro, e uma crise internacional, que já fechou os cofres dos fundos de investimentos. Dinheiro para lucrar no futuro, está fora da agenda internacional. A não ser que haja uma mudança de parâmetro no preço da gasolina. Aí o problema seria muito maior, e atenderia pelo codinome de inflação.
Sem esquecer que nos dias 4, 5 4 6 de junho, o Brasil vai sediar a conferência da ONU Rio+20, como referência da Eco 92, a reunião que trouxe ao país centenas de chefes de estados, durante 15 dias. A sede é o Brasil, mas todos os países opinarão sobre a pauta do encontro. Ainda não há uma definição, mas sabe-se que os ricos não querem saber de discutir sobre transferência de verbas ou de tecnologia nos últimos 20 anos. Não querem retrospecto. E, neste clima, ainda movimentado pela conclusão de duas hidrelétricas no rio Madeira, agora brigando pela cota do rio, do aumento no número de turbinas entre Jirau e Santo Antônio, com acusações de parte a parte, além de outras três em construção, a mais conhecida, Belo Monte, no rio Xingu, e duas outras no rio Teles Pires, no norte do Mato Grosso, fronteira com o Pará. Para arrematar o quebra-cabeça, um novo código florestal, que revelará as intenções brasileiras sobre a proteção de seus ecossistemas. Melhor dizendo, a desproteção, do jeito que está se anunciando, será o único código florestal, que ao invés de proteger para o fururo, vai logo enterrar no presente.
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