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domingo, 12 de junho de 2011

Fragmentos dos diários perdidos do Senhor C.

No tempo em que os jovens liam:

- "As pessoas jovens das minhas relações tinham algo em comum, por mais que se diferenciassem em tudo o mais: interessavam-se por coisas do intelecto. Estavam informadas sobre tudo o que aparecia nos jornais, mas só ficavam excitados quando se falava em livros. Uns poucos livros ocupavam o centro de sua atenção, e seria desprezado quem não estivesse informado sobre eles. Contudo, não se pode dizer que apenas eram repetidas certas opiniões gerais ou dominantes.  Cada um lia tais livros, uns liam trechos para os outros, ou citavam passagens de cor. A crítica não era apenas permitida, era bem-vinda, procurava-se encontrar pontos vulneráveis que abalassem a reputação pública de um livro. Esses pontos eram discutidos com ardor, sendo mais valorizados a lógica, a presença de espírito e o bom-humor (...)"

Anotações de leitura de:
 Elias Canetti, Uma luz em meu ouvido, p. 121. São Paulo: Companhia da Letras, 2010.


Se não era exatamente assim que se passava, na minha aldeia era habitual a troca de livros, a circulação por empréstimo de obras que o grupo todo acabava lendo, comentando, discutindo, criticando. E havia um templo mais que sagrado para todos nós, leitores ávidos de oportunidade: a biblioteca municipal tinha um acervo razoável de boa obras de literatura, de fazer inveja a um argentino como Jorge Luís Borges, que escreveu um belo conto sobre o mundo intensamente povoado deste tipo de lugar. Mas, agora, e sem saudosismo, tudo passou: não lemos mais livros, agora os ouvimos, ou simplesmente damos uma espiada nos seus resumos, ou trechos comentados pelo zilhão de sítios eletrônicos encontráveis num computador acoplado a internet.


(Comentário provavelmente escrito ao final do baile da Ilha Fiscal, aquele que decretou, segundo a história, o final do império)


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