Notas de leitura do Senhor C.:
No parágrafo 52 da Crítica da faculdade do Juízo, Kant vai apresentar as possíveis combinações entre as artes, a partir de uma classificação em artes elocutivas, artes figurativas e artes do belo jogo das sensações. Segundo ele, a uma poesia pode-se associar uma bela imagem; pode-se ligar a música ao canto, e estes a uma ópera; a música a dança; o sublime ao trágico, ou ao cômico etc. E arremata que, o que a toda arte bela é essencial: uma forma de comunicação que vá além da mera fruição dos sentidos, das sensações sensoriais, ou seja, que convenha à observação e ao ajuizamento, e cujo prazer seja cultura e disponha o espírito para idéias, tornando-o receptivo a prazeres e entendimentos outros, diverso.
Esta combinação não consiste, portanto, apenas na matéria da sensação disposta para o gozo, que nada daria à idéia, e apenas embota o espírito, deixando-o insatisfeito e instável pela consciência de sua disposição interna a fins do juízo da razão. Neste último caso, arte seria apenas dispersão, fuga e descontentamento do ânimo, o que já elimina da nossa taxonomia toda espécie de manifestação artística que não preencha o requisito de cumprir a finalidade de estimular e cultivar os ânimos.
Esta questão nos parece chave para o que fará logo a seguir, apontando características que aproximam, ou melhor, hierarquizam as artes na obtenção do estímulo do ânimo para o fim da razão. Assim, a poesia – sendo a arte que “deve sua origem, quase totalmente ao gênio e a que menos quer ser guiada pela prescrição ou exemplos” - ocupa, portanto, a posição mais alta.
“Ela alarga o ânimo, pelo fato de por em liberdade a faculdade de imaginação e de oferecer, dentro dos limites de um conceito dado, sob a multiplicidade ilimitada de formas possíveis concordantes com ele, aquela que conecta a sua apresentação com uma profusão de pensamentos; à qual nenhuma expressão lingüística é inteiramente adequada, e, portanto, elevar-se esteticamente a idéias.”
É, igualmente, bastante diferente de sua prima, a oratória ou eloqüência pura e simples, que rouba à poesia os elementos formais da bela aparência, para um discurso que quer, apenas e tão somente, arrebatar o ânimo dos ouvintes para o convencimento da fala do orador. Com a poesia, isso não ocorre!
“Na poesia tudo se passa honrada e lealmente. Ela declara querer estimular um simples jogo de entretenimento com a faculdade de imaginação, e na verdade, formalmente de acordo com as leis do entendimento, e não pretende colher de surpresas e enredar o entendimento através da exposição sensível.”
Pode-se dizer, portanto, que a poesia é ambas as coisas, simultaneamente: encanta pela exposição sensível, mas induz o entendimento, anima o espírito com idéias a que se chega pela multiplicidade de imagens que se associa à esta.
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