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quarta-feira, 29 de junho de 2011

A Bolsa Escola de Paulo Renato














Correio Braziliense - 29/06/2011

Marcos Coimbra
Sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi

A morte de Paulo Renato de Souza foi registrada por nossa imprensa com atenção maior que aquela, normalmente, dedicada à de ex-ministros. Com razão, pois ele foi bem mais que apenas um ministro "normal", os que pouca (ou nenhuma) diferença fazem em sua passagem pela administração.

Seus necrológios dedicaram espaço considerável a ressaltar o papel que teve na concepção e no lançamento do Bolsa Escola, que se costuma identificar como precursor do Bolsa Família. É uma justa homenagem, pois foi dele, de fato, a iniciativa do primeiro programa. Mas é inexato daí derivar que tenha sido o "verdadeiro criador" do segundo, que Lula teria somente ampliado.

A imensa popularidade do Bolsa Família, a mais nítida marca do governo petista, levou o PSDB, nos últimos anos, a reivindicar (sem muito sucesso) sua autoria. Para ele, tudo teria começado em 1994, na gestão de José Roberto Magalhães Teixeira, prefeito tucano de Campinas, e se consolidado nacionalmente através do programa criado por Paulo Renato.
O Bolsa Escola foi instituído, em julho de 2001, como um "programa de renda mínima vinculada à educação". Não era, exatamente, uma inovação: naquela altura, tínhamos mais de 50 projetos parecidos sendo executados no Distrito Federal e em municípios espalhados pelo país, todos envolvendo algum nível de transferência regular de renda para as populações mais pobres.

Desses, muitos haviam sido criados em meados da década anterior, alguns com forte ênfase no compromisso da família beneficiária com a educação (como o do Distrito Federal, quando Cristovam Buarque era governador), outros sem exigir (na prática) contraprestações do beneficiário (como o da prefeitura de Campinas).

O paladino da ideia de "renda mínima" no Brasil é o senador Eduardo Suplicy. Foi por sua militância que o Senado aprovou, ainda em 1991, quase que por unanimidade (contando com o voto do PSDB), um programa nacional destinado a assegurá-la a todos os cidadãos. Na Câmara, recebeu parecer favorável da Comissão de Finanças e Tributação, mas não chegou a ir a plenário. Só em 1997, muito modificado, o Congresso aprovou um projeto assemelhado, autorizando o Executivo a apoiar municípios que lançassem "programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas".

A federalização foi a novidade criada por Paulo Renato. O Bolsa Escola era maior que o simples apoio do governo federal às prefeituras. Por meio dele, a União assumia o controle e se responsabilizava por um programa de complementação de renda em larga escala.

Quem lê seus objetivos se impressiona com a ousadia e a rapidez. Iniciado quando faltava um ano e meio para o fim do governo FHC, a intenção do MEC era saltar de ínfimas 15 mil famílias beneficiárias, em meados de 2001, para 5,8 milhões em apenas 18 meses. De praticamente nada, a um programa maior que tudo que se fazia no setor.

Tira 10 quem explicar essa velocidade. O que, talvez, não seja difícil, se lembrarmos o que estava ocorrendo no cenário político naquele momento.

Entre tucanos de alta plumagem, havia quase um consenso: Lula perderia a eleição do ano seguinte, derrotado pelo medo do eleitor. Quem quer que fosse o candidato do PSDB era, a bem dizer, o novo presidente.

Paulo Renato queria ser candidato tanto quanto Serra, que era ministro da Saúde e tinha visibilidade. O que faltava ao ministro da Educação era algo equivalente aos genéricos, ao kit contra a Aids, ao Programa de Saúde da Família, que o adversário fazia bombar na mídia. Por que não um Bolsa Escola? Se fosse logo implantado e grande, seria um trunfo e tanto na disputa interna (que nada tinha de polida).

Isso não tira de Paulo Renato o mérito de sua criação. Para o país e, especialmente, para seus beneficiários, se o programa nasceu com objetivos político-eleitorais é menos importante que ser necessário, viável e bem concebido (ainda que, pela pressa, tivesse começado aos tropeços).

Consta que Paulo Renato nunca se conformou com o pequeno investimento publicitário que seu filho predileto mereceu do governo Fernando Henrique. Mas não devia ter ficado surpreso, pois sabia que o comando da área de comunicação do Planalto era mais simpático a Serra e nada faria para reforçar a posição do concorrente.

O resultado dessa disputa palaciana é que o Bolsa Escola ficou sem paternidade nítida. No longo prazo, foi o próprio PSDB quem mais se arrependeu de não tê-la assumido com estardalhaço.


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